29.9.08

É DIFÍCIL PRA VOCÊ? IMAGINE PRA GENTE!

Site Em Dia Com A Cidadania, 29/09/2008:

“É DIFÍCIL PRA VOCÊ? IMAGINE PRA GENTE!” ENTREVISTA COM ANDREI BASTOS, CANDIDATO COM DEFICIÊNCIA

Andrei Bastos é um jornalista conhecido no Rio. Trabalhou mais de 20 anos n’O Globo, de onde saiu aposentado devido a um câncer ósseo, que amputou uma de suas pernas.

Ele já trabalhava pelos direitos da pessoa com deficiência, com a treinadora Georgette Vidor, quando passou a fazer parte efetiva do segmento.

Hoje é candidato a vereador pelo PPS (número 23456) do Rio, numa campanha feita por doaçõs que, no total, não chegaram nem a 3 mil reais.

É o nosso entrevistado de hoje e o único representante das pessoas com deficiência que, realmente, pretende montar um QG para encarar as mais diversas máfias que embarracam a acessibilidade.

***

Você teve uma militância política, mas nunca quis se meter em vida partidária. O que o fez mudar de idéía?

AB: Em primeiro lugar, a partir do meu engajamento na luta pelos direitos das pessoas com deficiência, a compreensão de que essa mesma luta pode ganhar maior efetividade com as próprias pessoas com deficiência detendo mandatos legislativos. Como sou amputado e politizado, resolvi encarar essa briga. Em segundo lugar, e não menos importante, a constatação de que o ambiente político está quase totalmente deteriorado pela presença de bandidos de toda ordem em cargos eletivos, fazendo com que a atividade parlamentar hoje em dia seja ela mesma um problema da maior gravidade, o que compromete qualquer iniciativa pelo bem da coletividade. Hoje vivemos uma situação de emergência em nossa cidade, particularmente na Câmara Municipal, que tem até matadores entre os vereadores, e é preciso que a sociedade se mobilize para expulsar essa gentalha da vida pública. Como cidadão que respeita o interesse público, sem que isso represente nenhum mérito, resolvi encarar também essa briga, não sem deixar de convocar a participação dos meus pares na luta pela restauração da ética na política, pois só a pressão de larga parcela da sociedade será capaz de reverter o quadro de metástase social em que vivemos.

Qual a sua plataforma?

AB: Além do combate a quem e ao que promove a deterioração das instituições e dos princípios éticos, a exemplo dos Jerominhos e Babus da vida, pretendo trabalhar pelo direito de ir e vir no sistema de transporte público, pela acessibilidade nas ruas, nos prédios públicos e privados e à informação para pessoas com deficiência física, visual, auditiva e intelectual, pela educação de qualidade e inclusão no mercado de trabalho e pelo atendimento adequado no sistema de saúde.

Mas o ponto principal não é transporte público acessível? os governos ficam inventando pirotecnicas, esteiras na praia, etc, e as pessoas com deficiência não têm como chegar a nada disso.

AB: Sem dúvida, e essa compreensão eu já tenho há muito tempo, desde quando conheci grupos de pessoas com deficiência de Campo Grande e Nova Sepetiba que são prisioneiros de suas próprias casas porque não têm como sair às ruas, que são esburacadas, e porque não têm como ir a lugar algum pois não existem ônibus acessíveis ou mesmo adaptados. Portanto, o ponto principal é mesmo o sistema de transporte público inacessível e controlado por uma máfia que manda e desmanda na cidade, na Câmara de Vereadores e até no prefeito. Essa máfia é um dos principais tumores cancerígenos que precisam ser extirpados da sociedade carioca.

Você está preparado pra enfrentar a máfia do transporte público?

AB: Se estar preparado é ter consciência clara do problema e ter coragem de fazer as denúncias necessárias, estou. Assim como a arma do cidadão de bem é o voto, as armas com que enfrentarei essa e outras máfias serão as palavras que construirão os projetos de lei que apresentarei, as denúncias e discursos que farei, assim como as ações cabíveis no âmbito do Judiciário que provocarei.

E como vai ser isso?

AB: Minha equipe será formada por especialistas, como advogados, arquitetos urbanistas, educadores e profissionais da saúde, entre outros. Acredito que uma assessoria qualificada me proporcionará os subsídios necessários para dar efetividade às minhas iniciativas políticas.

Como a gente sabe, acessibilidade não é só transporte público e pessoas com deficiência não são apenas cadeirantes e muletantes. Como você pensa em legislar para incluir os cegos e os surdos, por exemplo, na vida urbana?

AB: Já não é mais nenhum mistério e basta que incorporemos os parâmetros do chamado Desenho Universal em todas as formulações, desde um projeto de lei que determine a obrigatoriedade da renovação da frota de ônibus exclusivamente com veículos acessíveis até um simples projeto de urbanização de uma praça. O conceito de Desenho Universal é tão abrangente que beneficia a todas as pessoas, mesmo a quem não tem nenhum problema motor ou sensorial e vê anulada a possibilidade de se acidentar, e não apenas a cadeirantes, muletantes, cegos ou surdos.

Você foi e é um dos grandes batalhadores contra o Estatuto da Pessoa com Deficiência , do senador Paulo Paim. Aliás, se chama Estatuto da Pessoa Portadora de Deficiência. Pode explicar o motivo e por que não se deve falar “portadores de deficiência”?

AB: O problema em relação às palavras que usamos para expressar nossa condição não é uma simples questão de semântica. Ao condenarmos determinadas formas estamos promovendo não apenas o respeito à dignidade do ser humano que tem uma deficiência, mas também a conscientização pela sociedade da nossa condição real. Eu costumo brincar com a palavra “portador” dizendo que de portador não tenho nada porque até deixei de portar uma perna. Falando sério, o que leva à superação desse conceito de “portador” é o entendimento de que a deficiência é um atributo do ser humano, como ser alto, baixo, magro ou gordo, sendo a pessoa com deficiência parte da diversidade humana e não um segmento isolado, segregado. Quando alguém fala “portador de necessidades especiais” então, a reação que tenho é de perplexidade tamanho o absurdo. Uma das muitas necessidades especiais que tenho é ir a Paris todo fim de ano mas, infelizmente, a grana não dá…

Você é um dos poucos representantes do segmento nas eleições cariocas, este ano. Quais são os outros? Há algum contato entre vocês?

AB: Eu conheço outras três pessoas com deficiência candidatas, mas só tenho contatos esporádicos com uma delas.

Como é fazer campanha sem dinheiro, praticamente? Como você levantou fundos?

AB: Se não fosse a necessidade maior de ser criativo, o que me dá muito prazer, fazer campanha eleitoral sem dinheiro seria deprimente, especialmente quando me deparo com a fartura de materiais dos outros candidatos. Quando não existe grana, mesmo a criatividade precisa ser direcionada para o possível. O que torna esse trabalho gratificante para mim é que o meu possível são as idéias, as propostas e as palavras que tenho que escrever para apresentar aos outros meus pensamentos. Isso é gostoso de fazer, particularmente quando percebemos o poder que as palavras têm.

Se ganhar, a gente já sabe o que você vai fazer. E se não der pra chegar lá?

AB: A luta continua, companheira. Na verdade, eu sempre entendi uma campanha eleitoral, e mesmo um mandato, como parte de um processo político que não deixa de existir nunca e que pode encontrar numa casa legislativa apenas um patamar superior de luta. Em outras palavras, se não der pra chegar lá vou dar continuidade ao meu trabalho no terceiro setor que, a propósito, já rendeu muitos bons frutos, como a ratificação da Convenção da ONU para as pessoas com deficiência, por exemplo, movimento do qual tenho orgulho de ter participado.

ANDREI BASTOS - 23456 - Vereador
PPS - Partido Popular Socialista

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