Deficiência moral
ANDREI BASTOS
Falar “deficiência moral” assim, sem explicar, parece redundante, pois este é o maior padecimento da sociedade brasileira, em especial da sua representação política, na sua maior parte ilegítima e não merecedora de nenhum respeito. Mas estou me referindo é ao projeto do deputado Efraim Filho de cota para deficientes em instituições públicas de ensino médio e superior, que, ao menos de mim, também não merece respeito.
Qual é a desse Efraim? Será que ele está querendo promover a inclusão das pessoas com deficiência na bandalheira geral nacional, de acordo com a lei do pobre Gérson, ou está mediocremente catando votinhos de coitadinhos, e de quem pensa que somos coitadinhos, para se manter na mordomia da capital federal?
Mesmo sem considerar que os dez por cento reivindicados já são um exagero, que somados às outras cotas formam o absurdo de deixar apenas 40% para quem não é negro, pobre ou deficiente e apenas estuda, o projeto do Efraim representa, mais do que gigantesco retrocesso para a emancipação plena das pessoas com deficiência, um verdadeiro ato de discriminação, à semelhança do famigerado projeto de Estatuto do coitadinho do Paulo Paim, e o deficiente que o defender estará equivocado, se autodiscriminando.
Fazer a coisa certa, que é bater de frente com o Executivo e cobrar tudo o que seja necessário para as pessoas com deficiência poderem assistir às aulas – da acessibilidade arquitetônica aos softwares para cegos –, para poderem chegar nas escolas e faculdades – da acessibilidade nas vias urbanas a um sistema de transporte público acessível –, isso pouca gente faz porque gera antipatia e não serve às negociatas eleitoreiras ou de sinecuras. É mais fácil fazer demagogia com um projeto como esse, enganar os coitadinhos, os que pensam que somos coitadinhos, e favorecer aos que vivem de olho em mordomias.
Ô Efraim, deixa de ser Paim! Afinal, como ficará a autoestima de meus amigos paralisados cerebrais que passaram no vestibular, se formaram, e exercem o jornalismo com uma competência pouco comum, ou do rapaz pobre e tetraplégico, morador de subúrbio distante, que passou para Ciência da Computação na UFRJ, assim como a de tantas outras mentes brilhantes de pessoas com as mais diversas deficiências? Dá só uma olhada na História para você ver quantos deficientes contribuíram para o progresso humano. Você vai encontrar de Beethoven a Roosevelt.
E o coitadinho do Efraim ainda diz que a cota para deficientes é mais justa do que as raciais “porque vai corrigir uma desigualdade visível”…
Ex-aluno do colégio Pinócchio-Visão, o deputado diz que “um aluno cego não disputa o vestibular em igualdade com outro que enxergue, mesmo que os dois tenham recebido a mesma formação escolar”. Claro, ô Paim, quer dizer, Efraim! Para igualar as condições, o cego precisa de braile ou software leitor de tela! A bem da mais visível verdade, inteligência e capacidade para estudar os cegos têm, e muitas vezes mais do que quem não é cego e estudou no colégio Pinócchio-Visão.
Em outra pérola do pensamento efrainiano, o parlamentar solta que “a divisão das vagas vai depender do bom senso, porque há deficientes que também se enquadram nos critérios de renda e etnia”. Descontando o fato de que não deva ser o bom senso a reger partilha de tal natureza, podemos dizer que esta é uma conclusão brilhante diante da possibilidade de ele vir a defender que os deficientes negros e pobres podem acumular três vagas, três carteiras escolares, três diplomas etc.
Representante do povo paraibano, todos nós sabemos que o maior problema do Brasil, e certamente mais ainda do seu estado, é justamente a pobreza. Porque não gastar sua energia de jovem parlamentar promovendo maior distribuição de renda na terra em que nasceu e no resto do país? Trabalhe para garantir a melhor educação inclusiva possível para todas as crianças brasileiras pobres, deputado. Qualquer levantamento estatístico indicará que a maioria das crianças com deficiência, negras ou não, está nas camadas de baixa renda, que não têm nem mesmo a atenção devida na hora do parto. Fazendo isso, certamente resolveremos com facilidade todo o resto, sem necessidade de passar um atestado de deficiência moral como esse projeto de lei.
***
Leia também:
Estatuto do coitadinho
***
“Deficiência moral” também foi publicado por:
Agência Inclusive,
Comdef-Rio,
Em Dia Com A Cidadania,
Fundação Astrojildo Pereira,
PPS/RJ
Falar “deficiência moral” assim, sem explicar, parece redundante, pois este é o maior padecimento da sociedade brasileira, em especial da sua representação política, na sua maior parte ilegítima e não merecedora de nenhum respeito. Mas estou me referindo é ao projeto do deputado Efraim Filho de cota para deficientes em instituições públicas de ensino médio e superior, que, ao menos de mim, também não merece respeito.
Qual é a desse Efraim? Será que ele está querendo promover a inclusão das pessoas com deficiência na bandalheira geral nacional, de acordo com a lei do pobre Gérson, ou está mediocremente catando votinhos de coitadinhos, e de quem pensa que somos coitadinhos, para se manter na mordomia da capital federal?
Mesmo sem considerar que os dez por cento reivindicados já são um exagero, que somados às outras cotas formam o absurdo de deixar apenas 40% para quem não é negro, pobre ou deficiente e apenas estuda, o projeto do Efraim representa, mais do que gigantesco retrocesso para a emancipação plena das pessoas com deficiência, um verdadeiro ato de discriminação, à semelhança do famigerado projeto de Estatuto do coitadinho do Paulo Paim, e o deficiente que o defender estará equivocado, se autodiscriminando.
Fazer a coisa certa, que é bater de frente com o Executivo e cobrar tudo o que seja necessário para as pessoas com deficiência poderem assistir às aulas – da acessibilidade arquitetônica aos softwares para cegos –, para poderem chegar nas escolas e faculdades – da acessibilidade nas vias urbanas a um sistema de transporte público acessível –, isso pouca gente faz porque gera antipatia e não serve às negociatas eleitoreiras ou de sinecuras. É mais fácil fazer demagogia com um projeto como esse, enganar os coitadinhos, os que pensam que somos coitadinhos, e favorecer aos que vivem de olho em mordomias.
Ô Efraim, deixa de ser Paim! Afinal, como ficará a autoestima de meus amigos paralisados cerebrais que passaram no vestibular, se formaram, e exercem o jornalismo com uma competência pouco comum, ou do rapaz pobre e tetraplégico, morador de subúrbio distante, que passou para Ciência da Computação na UFRJ, assim como a de tantas outras mentes brilhantes de pessoas com as mais diversas deficiências? Dá só uma olhada na História para você ver quantos deficientes contribuíram para o progresso humano. Você vai encontrar de Beethoven a Roosevelt.
E o coitadinho do Efraim ainda diz que a cota para deficientes é mais justa do que as raciais “porque vai corrigir uma desigualdade visível”…
Ex-aluno do colégio Pinócchio-Visão, o deputado diz que “um aluno cego não disputa o vestibular em igualdade com outro que enxergue, mesmo que os dois tenham recebido a mesma formação escolar”. Claro, ô Paim, quer dizer, Efraim! Para igualar as condições, o cego precisa de braile ou software leitor de tela! A bem da mais visível verdade, inteligência e capacidade para estudar os cegos têm, e muitas vezes mais do que quem não é cego e estudou no colégio Pinócchio-Visão.
Em outra pérola do pensamento efrainiano, o parlamentar solta que “a divisão das vagas vai depender do bom senso, porque há deficientes que também se enquadram nos critérios de renda e etnia”. Descontando o fato de que não deva ser o bom senso a reger partilha de tal natureza, podemos dizer que esta é uma conclusão brilhante diante da possibilidade de ele vir a defender que os deficientes negros e pobres podem acumular três vagas, três carteiras escolares, três diplomas etc.
Representante do povo paraibano, todos nós sabemos que o maior problema do Brasil, e certamente mais ainda do seu estado, é justamente a pobreza. Porque não gastar sua energia de jovem parlamentar promovendo maior distribuição de renda na terra em que nasceu e no resto do país? Trabalhe para garantir a melhor educação inclusiva possível para todas as crianças brasileiras pobres, deputado. Qualquer levantamento estatístico indicará que a maioria das crianças com deficiência, negras ou não, está nas camadas de baixa renda, que não têm nem mesmo a atenção devida na hora do parto. Fazendo isso, certamente resolveremos com facilidade todo o resto, sem necessidade de passar um atestado de deficiência moral como esse projeto de lei.
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Leia também:
Estatuto do coitadinho
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“Deficiência moral” também foi publicado por:
Agência Inclusive,
Comdef-Rio,
Em Dia Com A Cidadania,
Fundação Astrojildo Pereira,
PPS/RJ
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