1.1.10

Um dia depois do outro

ANDREI BASTOS

Pensei em escrever estas mal traçadas linhas antes do réveillon, mas resolvi deixar para os primeiros momentos do ano novo, na expectativa de ver comprovado um dos aspectos do que assunto aqui, que é a efemeridade do tempo evidenciada na passagem de ano. Mesmo considerando minha condição de aprendiz limitado, não mais que mero curioso, tento pegar carona nas idéias de relatividade do tempo, do disléxico Albert Einstein a Stephen Hawking, que nasceu 300 anos depois da morte do cego Galileu Galilei e tem esclerose lateral amiotrófica. Três pessoas com deficiência, vejam só!

Fiquei impressionado com a afirmação de Hawking de que só perceberemos o apagamento do Sol vários minutos depois, se tal acontecer, e comecei a construir caraminholas sobre nossa percepção do tempo no momento em que festejamos a chegada de um novo ano.

Muitos sóis se apagam no universo e nem sabemos, apenas porque seus destinos não nos afetam. Muitos talentos são excluídos da vida pela indiferença gerada no preconceito e na discriminação, e nem sabemos. O hiato entre o apagar da luz de um sol ou da inteligência e sensibilidade de um ser humano com deficiência e o momento em que o percebemos pode ser medido em minutos, anos-luz ou graus de incivilidade. São percepções diferentes que podemos ter do tempo.

Um ano tem doze meses, 365 dias, 8.760 horas, 525.600 minutos. Em cada um desses períodos acontecem coisas boas e ruins, em muitos desses minutos ocorrem desfechos de impasses. No entanto, podemos sintetizar essas noções de medidas para apenas o último dia do ano que termina, e que o sintetiza, e entendermos que a passagem de ano se dá, simplesmente, de um dia para o outro.

Pensando assim, começamos um novo dia em nossas vidas e nele queremos políticas públicas que efetivem a inclusão integralmente, ações de Estado que levem essa inclusão para todos, nos mais distantes rincões, e ver pelas costas governantes e legisladores que não trabalham para o bem comum ou que manipulam as carências populares em proveito próprio.

O dia que começa é de eleições e precisamos ficar atentos para não perdermos nada do que já conquistamos, assim como para avançarmos nessas conquistas não desperdiçando nossos votos e lutando por uma democracia participativa. Mais do que não precisarmos de nenhuma tutela excepcional, como o famigerado “Estatuto do Coitadinho”, somos plenamente capazes de cerrar fileiras com todos os cidadãos que desejam acabar com a política podre e corrupta praticada em nosso país.

A luta que travamos a vida inteira por inclusão e cidadania é suficientemente rica para fortalecer e garantir nossa autonomia e para consolidar a idéia de “nada sobre nós sem nós”. Nosso sol não se apagará e o tempo que precisamos é o nosso tempo.

Da mesma forma que na vida e no universo, nosso tempo também é relativo. Cada criança com deficiência tem seu próprio tempo para desenvolver plenamente seu potencial, cada adulto com deficiência tem seu próprio tempo para exercer plenamente sua cidadania, e para os governantes que não fazem com que nossas leis sejam cumpridas e abreviem esses tempos, nada como um dia depois do outro.

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