12.4.11

Cegos e surdos à discussão

ANDREI BASTOS

A discussão da inclusão de crianças com deficiência no ensino regular esquentou outra vez com a ameaça de fechamento do Instituto Nacional de Educação de Surdos e do Instituto Benjamin Constant. A impressão que se tem é que existe um antagonismo absoluto entre escolas especiais e educação inclusiva. Pode até ser que existam grupos entrincheirados de um lado e de outro, cegos e surdos a argumentos contrários, o que será lamentável.

Tão impossível quanto um adolescente com paralisia cerebral, que nunca recebeu estímulo para o desenvolvimento cognitivo, se integrar no ensino regular adequado para sua idade é a idéia de que ele e seus iguais, muitos com preservação total da capacidade intelectual, serão seres humanos melhores se mantidos separados.

Tão absurdo quanto instituições criadas no Império não terem conseguido aumentar seu alcance para mudar nacionalmente a realidade dos seus beneficiários, atendendo hoje a um número muito pequeno de deficientes, é a idéia de que a inclusão dos milhões que estão fora das suas salas especiais ocorrerá por decreto.

Quando o Conselho Nacional de Educação baixou a Resolução 04/2009, com a ausência do financiamento de matrícula exclusiva no Atendimento Educacional Especializado, condenando à extinção as chamadas escolas especiais, houve uma reação forte dos pais e o MEC recuou. Os fatos atuais demonstram que não se avançou no entendimento da questão.

O que a dificuldade para se promover a inclusão mais nos ensina é que só podemos acreditar em sucesso garantido quando o processo se inicia no berço. Em 2010 foi lançado o Plano Nacional pela Primeira Infância, elaborado pela Rede Nacional Primeira Infância com ampla participação da sociedade, particularmente de representantes do segmento das pessoas com deficiência na audiência pública realizada em 2009 pela OAB/RJ.

As contribuições de então foram incorporadas e o Plano passou a contemplar satisfatoriamente a inclusão das crianças com deficiência. Agora é cobrar sua aplicação para, entre outras coisas, encurtar essa discussão equivocada entre entrincheirados, de um lado na inclusão por decreto e, de outro lado, na idéia de que o atendimento especializado pode operar em escala nacional. Afinal, o que representam poucas centenas de beneficiários dos dois institutos diante dos 25 milhões de brasileiros com deficiência?

Só mesmo políticas públicas de alcance nacional, que promovam a inclusão das crianças com deficiência de maneira equilibrada, podem dar a escala necessária para a equação do problema. Fora disso, ninguém pode supor regras de aplicação geral, pois o que as pessoas com deficiência viveram até hoje foi o abandono, pelo Estado e pelas próprias famílias. É fácil discutir o assunto na capital imperial. Difícil é imaginar que crianças autistas, com síndrome de Down ou paralisia cerebral, abandonadas nas ruas de cidades nada imperiais, sem nomes, possam freqüentar escolas especiais ou de ensino regular a partir de amanhã.

***
Leia também:

“Isso é demência”

Estamos no mesmo barco

Regra e exceção

Que inclusão é essa?

PCD no Brasil

Resolução CNE/CEB nº 04/2009

Nosso Povo - IBGE

0 Comentários:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial