Não adianta me dedetizar
ANDREI BASTOS
Eu costumo dizer que nasci comunista porque meus pais, então com vinte
anos, militavam no Partidão. E digo também que fui criado numa célula partidária
porque em nossa casa, pelas minhas lembranças de infância, aconteciam muitas
reuniões políticas e intelectuais de esquerda, regadas a chupeta no meu caso, claro.
Na adolescência, militando contra a ditadura no movimento estudantil,
fiz muitos amigos que, depois dos sequestros, torturas e assassinatos praticados
pelos agentes do Estado, acreditaram na redemocratização e ingressaram em partidos
políticos alinhados à esquerda, tendo alguns até embarcado na invenção do
Golbery para desmontar Brizola e a esquerda em geral. Propósitos honestos à
parte, decidi ficar na minha, já descrente diante do circo armado.
Criei barba e filhos sem entrar para nenhum partido, até que Georgette
Vidor se elegeu deputada estadual pelo PPB (!) com minha ajuda na elaboração do
material de campanha, que produzi tapando o nariz e, diga-se de passagem,
minimizando ou ignorando a sigla partidária.
Já trabalhando no gabinete de Georgette na Alerj, fiquei feliz feito
pinto no lixo quando ela foi cooptada para o PPS, partido nascido na mesma
maternidade que eu. Animado pela possibilidade concreta de “fazer alguma coisa”
que o mandato da então deputada proporcionava, ainda mais contando com um
partido “socialista”, finalmente me filiei a uma agremiação política e
arregacei as mangas.
Depois de me dedicar com desprendimento às tarefas que muitas vezes eu
mesmo colocava para mim, num voluntarismo saudável, comecei a comprovar a tese
que inicialmente me fez descrente no sistema político partidário brasileiro que
nasceu da ditadura, vendido a preço de banana do Planalto Central.
Constatando a impermeabilidade da política partidária a qualquer
intervenção sincera e desinteressada pelo bem comum, já que tal política é
regida pelo interesse pessoal ou de grupos em benefício próprio, quase sempre
pecuniário, passei a acreditar que só a implosão do sistema, em atos de
denúncia da falência da democracia representativa de dentro pra fora, poderia
fazer com que deixasse de existir essa gigantesca pedra no caminho da evolução
social.
Acreditando nesse caminho de implosão do sistema político partidário e de
transformação da democracia representativa em participativa, cheguei a propor
essa opção a companheiros da direção municipal do PPS, onde ocupei a função de
diretor de Comunicação. Recebi muitos sorrisos condescendentes. Como não vivo
disso, de política partidária, mais facilmente posso prosseguir com minha fé e
minha faca amolada, me esforçando para desmascarar a “armadilha democrática”
que os ditadores nos deixaram.
Por fim, e obviamente, não posso negar que os últimos acontecimentos envolvendo
o PPS, onde fiz grandes e respeitáveis amigos, me entristeceram e foram as
últimas gotas d’água para mim. Confortado pela promessa de mantermos nossos
princípios e visão crítica, nas palavras de Stepan Nercessian na reunião do
diretório que decidiu pela adesão ao governo no Rio de Janeiro, tentei
compensar minha insatisfação com a ideia de ser a mosca que pousaria nessa sopa.
Agora, desfiliado, serei a mosca que pousará em todas as sopas, aliás, como
sempre fiz.
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