6.6.08

Surdos podem dirigir. Ser engenheiros da Petrobras, não

ROSE BAHIANA

Os surdos estão aptos para dirigir automóveis nos centros urbanos. Mas não para trabalhar na Petrobras. Não em cargos que exijam nível superior, como engenheiros de petróleo. A Petrobras baseia a decisão numa interpretação livre do artigo 38 do decreto 3298/99, que determinou o sistema de cotas para deficientes em concursos. O artigo desobriga as empresas públicas a instituir os 5% de cotas, quando o cargo exigir “aptidão plena” do candidato. É o bastante para alguns burocratas decretarem que surdo não está apto para ocupar uma das 251 vagas de engenheiro de petróleo.

Não adianta burlar a proibição e fazer a prova em igualdade de condições. Será barrado pela perícia médica. O problema é vivido por um engenheiro químico inscrito para o próximo concurso da estatal. Mesmo com um currículo que inclui parte do curso de Astronomia, a conclusão do curso de Engenharia Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e estágio no Cenpes, ele só deve pretender cargo compatível com a sua condição de surdo: técnico de nível inferior.

O engenheiro passou por uma operação de implante coclear (técnica avançada de combate à surdez) com recursos da própria Petrobras, através da qual ganhou níveis aceitáveis de audição. Quando realizada em crianças, as transformam em ouvintes. Mas, mesmo antes disso, já falava e se comunicava por palavras. Caso contrário, não se formaria pela UFRJ. Há anos atrás, quando ainda era bebê, o médico que diagnosticou sua surdez disse que o máximo que seus pais poderiam esperar dele era a ocupação de lixeiro. Nem isso é possível: tem qualificação demais para o posto. Mas, num país tão pródigo em oferecer recompensas e caridades, tais como o Bolsa-Ditadura e o Bolsa-Família, talvez um bom caminho fosse reivindicar o Bolsa-Discriminação.

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