24.4.13

Decadência da ABI

ANDREI BASTOS

Saber envelhecer é uma virtude pouco apreciada e nada cultivada por quem se apega desmedidamente a algum poder, mesmo que seja o de síndico de prédio residencial. De síndico a presidente da república, muitas gradações do brilho que mais alimenta as vaidades hipnotizam as almas pequenas de seres humanos menores ainda.

Quando o poder individual, em qualquer nível, resulta de processos coletivos de conquista de direitos, temos justificada uma liderança real, que nasce com os dias contados por causa de sua própria natureza transformadora. Contrariar esse movimento é condenar a conquista realizada à estagnação e degradação.

Comecei minha carreira de jornalista aos 19 anos, no extinto Correio da Manhã, e sempre integrei os processos coletivos da minha categoria profissional, tanto na luta contra a ditadura como nas reivindicações por melhores salários, reconhecendo e apoiando as lideranças legítimas que se afirmaram nesses processos.

Durante toda a minha vida profissional portei com orgulho a carteira da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), que renovei todos os anos, até recentemente. Há coisa de uns dois anos, desisti da carteira, e no ano passado, pensei em desistir da própria ABI. Ao receber os primeiros boletos de cobrança de mensalidade, olhei com melancolia para eles e os joguei no lixo.

Passados alguns meses, com mensalidades acumuladas, reagi e retomei os pagamentos, resgatando em mim a crença de que à ABI só podia estar reservado um destino digno, ao menos, apesar de se evidenciar na sociedade que a brava combatente do passado parece não ter sabido envelhecer, se escondendo envergonhada atrás de andaimes “de fachada”.

Além disso, para um ex-estudante de arquitetura como eu, mais do que os andaimes “de fachada”, a aparência lúgubre das instalações do Edifício Herbert Moses, projetado com inspiração nas ideias do meu ídolo Le Corbusier, denuncia a incúria da sua administração. Do hall de entrada, no andar térreo, ao jardim de Burle Marx que não existe mais, no 13º andar, tudo cheira a mofo.

Bons tempos em que ventos transformadores arejavam as salas e auditórios da ABI, expulsando o mofo que hoje ocupa suas paredes e acomoda sua administração em apego apoplético a um poder decrépito! Quero voltar a ter orgulho da ABI e a renovar minha carteira de sócio todo ano, e não vejo como isso poderá acontecer com a permanência do atual estado de coisas.

É preciso mudar a ABI, para que a instituição não envelheça sem a dignidade que não faz falta a quem não sabe envelhecer e, decadente, a compromete com evidente incapacidade de gestão. Quero voltar a frequentar a Casa do Jornalista com o mesmo espírito que me animava nos processos coletivos dos jornalistas no passado, solidário e encorajado pelos meus pares.

Para a ABI, saber envelhecer é, antes de tudo, saber renovar a alma com a grandeza de reconhecer que nenhum poder é eterno e a alternância na sua ocupação mantém saudável o seu corpo, que é coletivo, de todos os jornalistas.

Andrei Bastos é jornalista.

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