11.6.13

Carta à amante do marido

Senhora,

Saiba que o único motivo que me fará continuar ao lado de meu marido é saber que ele me ama. Disto, confesso, ele me tem dado grandes provas. Mas, paralelamente, vem mantendo um “caso” com a senhora. Sim, digo um “caso” porque não me parece uma simples amizade o grau de intimidade que vem concedendo a meu marido: com tantas visitas à sua casa, convites para que ele a acompanhe a às suas amigas em reuniões e passeios, compras que fazem juntos até mesmo com a intromissão do seu gosto em coisas de uso pessoal dele. Enfim, tudo aquilo que um marido costuma fazer acompanhado de sua mulher.

A observação que venho fazendo de tal comportamento me deu o direito de pensar (sem que isso possa ofendê-la) que a senhora já havia chegado até mesmo à permissividade… de “faire l’amour”… Mas recuso-me a acreditar que uma mulher na sua posição social de ex-embaixatriz, de viúva recatada e tão católica possa conformar-se com o papel da “outra” na vida de um homem casado: aceitando a condição de ser apenas a aventura e a distração do fim de semana.

No entanto, as circunstâncias forçam-me a acreditar nisto. Pois a senhora deixou bem claro ao meu marido que não gostaria de terminar esta “amizade”. Embora fizesse muita questão de afirmar-lhe que “jamais ‘roubaria’ o marido de outra mulher, principalmente sendo o pai de filhos menores, entre os quais duas garotas de 11 e 13 anos. Quando meninas adolescentes necessitam tanto de um pai dentro de casa”.

Pois saiba, minha senhora, que meninas adolescentes necessitam dentro de casa é do amor mútuo de seus pais. Na base do amor correspondido é que se formará a sua felicidade e terão construído o seu equilíbrio emocional.

Quando na vida de um casal o amor é unilateral, os filhos deste casal guardarão como exemplo a hipocrisia de uma felicidade para “mostrar aos outros”, ou seja, uma enorme mentira. Terá sido esta a vida de casada que a senhora teve ao lado de seu marido?

Tenha a certeza que de minha parte jamais aceitarei tal ambivalência:

Sou uma mulher extraordinariamente compreensiva e tolerante, mas tudo tem o seu limite. A minha tolerância termina onde começa a minha necessidade de ter comigo o homem que eu amo, e por que me ama.

Como poeta e grande galanteador, que é o meu marido, ele já deve lhe ter dito em momentos coloquiais “que a senhora tem tudo o que um homem pode pretender de uma mulher: beleza, elegância, sensibilidade, impulso sensual, companheirismo, diálogo etc. etc.

Penso que chegou a hora da verdade: de uma definição por parte de meu marido, da senhora, e de mim mesma. Para que nenhum de nós cometa a leviandade de brincar com os sentimentos alheios. Ainda que desta verdade resulte a nossa separação. Assim, eu continuaria amando e respeitando o homem pela sua honestidade de sentimentos. Do contrário, com certeza, acabaria por desprezar e odiar o marido.

Não tenha remorsos nem escrúpulos em “roubá-lo” de mim. De uma mulher como eu que, acima de tudo, acredita que somente o amor dá a razão por que a vida deve ser vivida.

Se não é verdadeiro o seu amor por mim, e a verdade é que ele a ama, que vá viver com a senhora. E faça disso bom proveito.

Respeitosamente,

Uma mulher traída.

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