15.1.09

Somos presos comuns

O Globo, Opinião, 15/01/2009:

Somos presos comuns

STEPAN NERCESSIAN

Em Copacabana o cidadão me para, declara-se meu eleitor e dispara: - E aí, meu vereador, posso confiar que este ano sai o Código de Ética?

- Vamos trabalhar para isso, vamos trabalhar.

Vale lembrar que um pouco antes das últimas eleições, em um longo julgamento no STF, do qual participaram onze ministros, seis decidiram liberar os candidatos que respondem a processos na Justiça - os chamados “fichas sujas”, para que pudessem concorrer nas eleições municipais.

Temos aqui na Câmara um projeto em andamento. O que mais se escuta é que, tal como está, receberá muitas emendas e um semestre mais se passará sem que seja votado.

Pensamos, muitos vereadores, em criar a Comissão de Ética antes do código e nortear a ação dessa Comissão por preceitos escritos em decreto que prevêem punições e sanções até razoáveis “enquanto seu lobo não vem”.

Essa é uma parte do enredo, mas tem outras importantes de serem estudadas:

1. Vereador não tem imunidade parlamentar, assim como nenhum político deveria ter. Ao contrário dos deputados, senadores e ministros, vereador pode ser processado e preso em qualquer das 24 horas do dia sem autorização de ninguém.

2. Para ser vereador é necessário ser filiado a um partido político. Não tem vereador avulso, e inclusive o mandato pertence ao partido.

3. Os partidos têm regimento interno, estatuto e a maioria deles sua comissão de ética.

4. Para ser candidato o partido precisa promover o registro de cada um na Justiça Eleitoral, que tem um rol de exigências, documentos e certidões que são um verdadeiro raio X da vida pregressa do candidato a candidato.

5. A Justiça Eleitoral aceita o registro e promove as eleições apenas com nomes aprovados por ela.

6. O povo elege.

7. A Justiça Eleitoral diploma e empossa.

8. A Câmara tem regimento interno. O Município tem Lei Orgânica e o vereador eleito é obrigado a conhecê-la e respeitá-la.

9. A Constituição Federal, em seu art. 5º , inciso LVII, dispõe: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.” Dessa forma, a nossa lei maior garante o princípio da presunção de inocência.

Para não virar dez mandamentos fico nos nove.

Acredito que a discussão é mais profunda, pois o sujeito, antes de assumir, passa por diversas “peneiras”, que poderiam muito bem depurar a situação civil e criminal do postulante ao cargo público.

Existe o alistamento eleitoral, a filiação partidária, a convenção nos partidos para a escolha dos candidatos, a eleição, a diplomação e a posse. Chega a ser risível que só depois desse processo todo se descubra que o indivíduo é incapaz para exercer o cargo, salvo tenha cometido o crime ou delito no transcurso de uma dessas etapas.

O verdadeiro Código de Ética da Câmara Municipal deve ser escrito a muitas mãos. Não é voo solo. Por isso acredito que os partidos devem escolher melhor e com mais rigor seus candidatos; os eleitores, em quem votam; e os tribunais, a quem diplomam.

As portas deste Palácio estarão sempre abertas para a participação popular e para que a Justiça cumpra seus mandados de prisão sem precisar de autorização do plenário. Por enquanto, ao contrário das Câmaras estadual e federal, vereador ainda é parecido com o povo em geral, somos presos comuns, sem direito a prisão especial. Aproveitem.

STEPAN NERCESSIAN é ator, vereador (PPS) e atual vice-presidente da Câmara Municipal do Rio de Janeiro.

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