Só é preciso pensar diferente
Jornal Cidade da Barra, Opinião, 17/02/2009:
Só é preciso pensar diferente
ANDREI BASTOS
A Barra da Tijuca ainda é um bairro jovem, com maioria da população igualmente jovem. Foi o traço de um urbanista brilhante que desenhou sua estrutura sobre os areais e lagoas e furou rochas e montanhas. A Barra tem muito a crescer e pouco a aprender. Só precisa aproveitar bem as condições criadas por Lúcio Costa.
Há 30 anos, quando me tornei seu morador, o BarraShopping não existia e a pergunta “Afinal, de quem é a calçada?”, que virou manchete do jornal Cidade da Barra, não faria sentido porque quase não existiam calçadas. Eu tinha 27 anos e me sentia praticamente um desbravador diante das dunas de areia branca que dominavam grande parte da paisagem. Lamento até hoje ter mudado para Botafogo porque minha mulher não aprendeu a dirigir.
Eu sei que se naquele tempo, e mesmo antes, quando o traço do urbanista só existia no papel, fosse conhecido o conceito de acessibilidade, a pergunta que virou manchete também não faria sentido atualmente, não apenas porque a acessibilidade estaria incorporada às construções, mas principalmente porque teria se convertido numa componente da nossa cultura e hoje desconheceríamos problemas como o da pergunta.
Acontece que tal conceito, resultante da luta pela emancipação das pessoas com deficiência, que no Brasil tem mais ou menos 30 anos de efetividade, foi entendido de maneira profunda há pouco tempo, sendo explicitado com clareza apenas no texto da Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, assinado em Nova Iorque (EUA) em 2007.
Nosso país ratificou a Convenção da ONU com equivalência de Emenda Constitucional em 2008, como resultado de uma mobilização sem precedentes das pessoas com deficiência brasileiras, e agora não podemos alegar desconhecimento para não cuidarmos das calçadas e de todas as construções.
Mas o desconhecimento não era causado só pela inexistência de uma luta e de um conceito. Na verdade, ele tem origem em nossas raízes culturais primordiais, que nos fazem negar condições diferentes das que consideramos ideais para nós. É por isso que achamos que determinadas coisas só acontecem com os outros, como envelhecer ou ficar deficiente.
Aos 27 anos, eu não poderia imaginar que amputaria uma perna aos 53 e me tornaria uma pessoa com deficiência. Da mesma forma, ninguém poderia imaginar que a tecnologia, a medicina e a ciência realizariam tantas conquistas para aumentar a expectativa de vida de todas as pessoas e a autonomia dos deficientes. O que falta? Consertar calçadas?
Não, infelizmente. Mas os moradores e construtores da Barra precisam apenas começar a pensar diferente. Ou seja: precisam abrir os olhos para a diversidade humana, que se compõe também de pessoas com deficiência, e incorporar a acessibilidade ao projeto, seja de calçada, condomínio ou centro comercial. Quando isto acontece, não existe custo adicional e evita-se a reforma, hoje obrigatória e às vezes cara.
Por ainda ser um bairro com muito espaço para se acomodar, a Barra não terá dificuldade em resolver problemas de acessibilidade, seguindo sua vocação urbanística de um futuro mais digno para todos, particularmente para seus jovens moradores que, faço votos, um dia serão seus moradores idosos.
***
Clique aqui e veja também no blog do Cidade da Barra.
Só é preciso pensar diferente
ANDREI BASTOS
A Barra da Tijuca ainda é um bairro jovem, com maioria da população igualmente jovem. Foi o traço de um urbanista brilhante que desenhou sua estrutura sobre os areais e lagoas e furou rochas e montanhas. A Barra tem muito a crescer e pouco a aprender. Só precisa aproveitar bem as condições criadas por Lúcio Costa.
Há 30 anos, quando me tornei seu morador, o BarraShopping não existia e a pergunta “Afinal, de quem é a calçada?”, que virou manchete do jornal Cidade da Barra, não faria sentido porque quase não existiam calçadas. Eu tinha 27 anos e me sentia praticamente um desbravador diante das dunas de areia branca que dominavam grande parte da paisagem. Lamento até hoje ter mudado para Botafogo porque minha mulher não aprendeu a dirigir.
Eu sei que se naquele tempo, e mesmo antes, quando o traço do urbanista só existia no papel, fosse conhecido o conceito de acessibilidade, a pergunta que virou manchete também não faria sentido atualmente, não apenas porque a acessibilidade estaria incorporada às construções, mas principalmente porque teria se convertido numa componente da nossa cultura e hoje desconheceríamos problemas como o da pergunta.
Acontece que tal conceito, resultante da luta pela emancipação das pessoas com deficiência, que no Brasil tem mais ou menos 30 anos de efetividade, foi entendido de maneira profunda há pouco tempo, sendo explicitado com clareza apenas no texto da Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, assinado em Nova Iorque (EUA) em 2007.
Nosso país ratificou a Convenção da ONU com equivalência de Emenda Constitucional em 2008, como resultado de uma mobilização sem precedentes das pessoas com deficiência brasileiras, e agora não podemos alegar desconhecimento para não cuidarmos das calçadas e de todas as construções.
Mas o desconhecimento não era causado só pela inexistência de uma luta e de um conceito. Na verdade, ele tem origem em nossas raízes culturais primordiais, que nos fazem negar condições diferentes das que consideramos ideais para nós. É por isso que achamos que determinadas coisas só acontecem com os outros, como envelhecer ou ficar deficiente.
Aos 27 anos, eu não poderia imaginar que amputaria uma perna aos 53 e me tornaria uma pessoa com deficiência. Da mesma forma, ninguém poderia imaginar que a tecnologia, a medicina e a ciência realizariam tantas conquistas para aumentar a expectativa de vida de todas as pessoas e a autonomia dos deficientes. O que falta? Consertar calçadas?
Não, infelizmente. Mas os moradores e construtores da Barra precisam apenas começar a pensar diferente. Ou seja: precisam abrir os olhos para a diversidade humana, que se compõe também de pessoas com deficiência, e incorporar a acessibilidade ao projeto, seja de calçada, condomínio ou centro comercial. Quando isto acontece, não existe custo adicional e evita-se a reforma, hoje obrigatória e às vezes cara.
Por ainda ser um bairro com muito espaço para se acomodar, a Barra não terá dificuldade em resolver problemas de acessibilidade, seguindo sua vocação urbanística de um futuro mais digno para todos, particularmente para seus jovens moradores que, faço votos, um dia serão seus moradores idosos.
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