7.11.09

Coluna do Milton

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HISTÓRIA TALVEZ INOCENTE, MAS COM MISTÉRIO E MUITOS BILHÕES

Milton Coelho da Graça

Com 275 milhões no cofre e quatro sondas, uma nova empresa privada de exploração de petróleo - a segunda no país - começa a operar no rio Solimões (pré-nome do rio Amazonas ao entrar em território brasileiro e até receber as águas do rio Negro) e promete encontrar entre 4 a 6 bilhões de barris de petróleo leve, no valor teórico de uns 15 bilhões de dólares. E isso ainda não seria o filé, mas sim o gás, que a HRT Oil & Gás avalia ter um potencial de 10 a 20 trilhões de pés cúbicos e, sendo confirmados, mais um bom dinheirinho: aí por volta de 40 a 45 bilhões de dólares (as estimativas dos volumes foram dadas à imprensa pelos diretores da HRT, as estimativas da receita são minhas).

Trocando em miúdos: se a expectativa da HRT Oil & Gás se confirmar, o dinheiro que ela investiu para comprar 51% da Petra Energia e da M&S Brasil, mais o que obteve de outros investidores de risco o necessário para completar o capital da empresa poderá se multiplicar umas 750 vezes se todas as esperanças se confirmarem. Um resultado melhor do que acertar uma centena no jogo-do-bicho.

Mas há um certo mistério em toda essa história. Eu era editor do vespertino Diário da Noite, em Recife, quando o repórter de plantão no aeroporto de Guararapes e transmitiu pelo telefone entrevista feita com uma equipe de geólogos russos, contratados pela Petrobrás, chegando de Manaus e embarcando para o Rio em outro voo. Quando li a entrevista, já reescrita pela redatora Cristina Tavares, posteriormente uma das melhores parlamentares já eleitas pelo povo brasileiro.

A história era tão sensacional que imediatamente tornou-se a manchete do jornal. Os russos simplesmente afirmaram que havia muito petróleo no Amazonas. E por que não havia ainda sido descoberto pela Petrobras? Porque ele estava além do alcance das sondas até então existentes no Brasil. Seria preciso - disseram os geólogos - perfurar pelo menos até 2500 metros.

A Petrobras posteriormente optou por concentrar no mar os esforços de exploração (veja abaixo a nota assinada por Eliezer de Oliveira Martins, técnico em geologia aposentado da Petrobrás e então ligado à Superintendência da Amazônia). Mas a empresa tem participado das licitações de blocos terrestres pela Agência Nacional de Petróleo, em diversos estados da Federação. Aparentemente não se interessou por esses oito lotes que têm possível valor astronômico.

O presidente da HRT é Márcio Rocha Mello, geólogo, com 25 anos de experiência na Petrobras.

Não afirmo que haja qualquer coisa errada em toda essa história. Mas é estranha. Como qualquer cidadão agora pode ser jornalista investigativo, que tal os mais curiosos saírem procurando na Internet quem são os sócios de todas essas empresas mencionadas? Por que a Petrobras não quis apostar nesses 8 poços com o prêmio de 700 por 1 (entre os melhores do mundo!)? Por que a empresa vencedora da licitação passou adiante os direitos apesar das ótimas possibilidades? Onde andam os relatórios daqueles geólogos russos? Quem teve acesso a eles?

***

Eliezer de Oliveira Martins

Em 1954 a Petrobrás contratou os serviços do norte-americano Walter Link, então geólogo chefe da Standard Oil, para dirigir o Departamento de Exploração (DEPEX) e desenvolver a pesquisa de petróleo nas bacias sedimentares do território brasileiro. Juntamente com Link outros técnicos estrangeiros, principalmente americanos, foram contratados.

Os nacionais ainda engatinhavam nessa tecnologia que, paulatinamente, ía se tornando importantíssima para a riqueza das nações.

Vale observar que em 1958 o quadro de técnicos da Petrobrás no Brasil apresentava 136 profissionais, sendo 72 estrangeiros e 64 nacionais, entretanto, destes últimos, muitos se encontravam no exterior fazendo cursos pertinentes a pesquisa de petróleo. Desta forma, era evidente que a língua dominante nos escritórios do DEPEX era a inglesa. Os relatórios técnicos e expedientes oficiais estavam dentro dessa conformação linguística.

Com a descoberta de petróleo na área de Nova Olinda-AM, Mr. Link estimulou as atividades exploratórias na região. Turmas de Geologia, Sísmica, Gravimetria, magnetometria, perfuração, passaram a operar em todas as bacias, à procura de dados que ajudassem os técnicos nas interpretações das estruturas geológicas.

Na realidade, o período Link foi caracterizado por perfurações de poços sem o necessário respaldo técnico-geológico, consequência da pressa em perfurar, como a dar satisfação ao povo brasileiro de trabalho intensivo, devido à descoberta de óleo em Nova Olinda e a recente campanha de “O Petróleo é Nosso”.

Muitas vezes as perfurações se faziam no arcabouço de drenagem, devido à facilidade de transporte fluvial, pois era difícil o transporte terrestre e os recursos disponíveis não permitiam perfurações além de 20 quilômetros da margem de um rio navegável.

As definições de estruturas geológicas, que seriam o indicativo mais inteligente recomendado para uma locação, inexistiam, ou se existissem ali o poço se encontraria mais por obra do acaso do que por uma criteriosa decisão técnica.

Com os resultados das perfurações, Mr.Link avaliou todas as bacias brasileiras e classificou-as com letras do alfabeto. As bacias terrestres da Amazônia foram classificadas com as letras C e D, que caracterizam aquelas bacias sem condições geológicas de geração e armadilhamento de hidrocarbonetos.

Mr. Link apresentou o resultado desta avaliação à Direção da Petrobrás, aconselhando o abandono das bacias de Solimões, Baixo Amazonas e do Parnaíba. Este fato suscitou dúvidas no corpo técnico nacional e ainda hoje se ouve questionamentos a respeito. As bacias foram realmente avaliadas? Conclusões restritas extrapoladas para o geral? A extensão das bacias, as enormes distâncias quilométricas entre poços, as poucas informações geofísicas e geológicas dos substratos da região, foram consideradas? A honestidade, princípio básico que deve nortear as conclusões científicas, estimulou realmente o ânimo do tecnico norte-americano? Hoje, a bacia de Solimões, que fora classificada com bacia D, é produtora de gás e óleo leve(45 API) e aloja os campos de Urucu e Juruá.

Walter Link aconselhou, também, à direção da Petrobras que, se quisesse encontrar petróleo realmente, fosse procurá-lo em bacias mais promissoras, no mar ou em outros países, inspiração que deu margem para a criação da BRASPETRO.

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