5.12.09

Onde viver é uma triste rotina

Área de lazer de crianças e jovens, até recentemente (Foto: Andrei Bastos)

O Globo/Extra, Baixada, 05/12/2009:

Onde viver é uma triste rotina
Integrante da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ faz alerta sobre condições de abrigo em Duque de Caxias

Por Dandara Tinoco
dandara.tinoco@oglobo.com.br
dandara.tinoco@extra.inf.br

A Casa Abrigo Betel fica em uma localidade chamada Ilha, no bairro Nova Campina, em Duque de Caxias. E os 38 adultos e nove crianças e adolescentes que vivem ali parecem mesmo estar num pedaço de terra perdido em alto-mar. Afinal, encontram-se isolados, praticamente incomunicáveis. Os abrigados pela instituição filantrópica têm problemas como paralisia cerebral, síndrome de Down e autismo. Andrei Bastos, jornalista e integrante da Comissão de Direitos Humanos da seção Rio de Janeiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), chama a atenção para as más condições do local:

- A instituição funciona como um depósito de gente. Não há atividades para estimular o desenvolvimento cognitivo dos abrigados. Além disso, remédios psicotrópicos, como Gardenal e Haldol, são aplicados de forma indevida em pessoas com autismo e síndrome de Down, por exemplo. Os funcionários mostram desconhecimento em relação às diferenças entre as deficiências.

Porém, Bastos esclarece que não acha o fechamento do local uma boa solução:

- Nosso objetivo não é pedir a interdição da casa. Os internos não são maltratados e há higiene, o problema é a falta de recursos técnicos.

Segundo o integrante da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ, a ideia é enviar um dossiê sobre o abrigo para a secretária estadual de Direitos Humanos, Benedita da Silva:

- Pediremos à secretária que promova um intercâmbio entre a casa e instituições que tratam portadores de deficiência com funcionários capacitados. Há outros passos importantes, como equipar o local com recursos tecnológicos, para que os abrigados possam fazer fisioterapia.

A assistente social Flávia Azevedo, coordenadora do projeto “Justiça móvel para a primeira infância”, vinculado à Organização de Direitos Humanos Projeto Legal”, também questiona o tratamento aplicado na Casa Abrigo Betel:

- Os adultos e as crianças não têm convivência familiar ou comunitária. Suas habilidades não são exploradas. Falta acesso a políticas sociais.

‘O trabalho caiu no nosso colo’, afirma diretora

A Casa Abrigo Betel foi fundada há nove anos pela pedagoga Maria José Cavaleiro, diretora da instituição, que tem registros nos conselhos municipais de Assistência Social e de Direitos da Criança e do Adolescente de Duque de Caxias. Ela explica que, em 2000, o trabalho não era voltado para pessoas com deficiências.

- A associação tinha vários projetos. Em 2000, a Fundação para Infância e Adolescência (Fia) nos procurou dizendo que precisava de um lugar para abrigar portadores de deficiência. Nós tínhamos esse local, que, na época, era um galpão. A Fia o aprovou e trouxe pessoas. Esse tipo de trabalho não era o objetivo que tínhamos traçado, ele caiu no nosso colo - diz Maria José.

Hoje, o abrigo tem cerca de 50 funcionários, a maioria voluntários. Um deles é o filho da diretora, Daniel Cavaleiro, um dos coordenadores da instituição. De acordo com Maria José, ele cumpre todas as exigências no que diz respeito ao tratamento para pessoas com deficiência. Ela afirma, no entanto, que manter a instituição é uma tarefa difícil:

- Temos convênios municipais, estaduais e federais, mas todos só ajudam com alimentação e material de higiene. Fazemos muito com recursos próprios e doações. A partir do momento que assumimos essa responsabilidade, temos de correr atrás.

Maria José relata que um psiquiatra e um clínico geral visitam o local uma vez por mês para examinar crianças, adolescentes e adultos. Ela nega que os medicamentos usados não sejam adequados.

- Cada um tem seu tratamento específico. Não sei os nomes dos remédios que tomam e o que cada um tem porque não sou médica. Quando abrimos, a Fia mandou tudo misturado para a gente - diz, referindo-se à variedade de deficiências. - Estamos tentando focar um determinado perfil de problema motor ou psíquico.

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