16.9.07

Luta por cidadania

Entrevista de Teresa Amaral ao RJTV – Bate-Papo, 15/09/2007:

Link da entrevista (vídeo):

http://rjtv.globo.com/RJTV/0,19125,VRV0-3119-301564-20070915-531,00.html

Transcrição:

O jornalista e acadêmico Odylo Costa Filho, falecido há quase 30 anos, comoveu o Brasil ao enfrentar, com resignação, a doença mental de uma filha e o assassinato de um outro filho. Teresa Costa d’Amaral, a segunda filha de Odylo, aprendeu com o pai a bondade. Ela conversa sobre cidadania e solidariedade agora na Coluna Bate-Papo.

Nós, todos nós, somos feitos daquilo que lutamos para ser, daquilo que nos esforçamos para ser e daquilo que a vida nos impõe. E o que a vida nos impõe, às vezes, é difícil. O nosso grande desafio como seres humanos é, apesar dessas dificuldades, construir uma vida melhor, um futuro melhor para nós mesmos e para aqueles que estão à nossa volta – como fez e faz a nossa entrevistada no Bate-Papo de hoje, Teresa Costa d’Amaral.

RJTV – Teresa, se a ONU tem razão, se 10% da população são pessoas deficientes, no Brasil teríamos 18,5 milhões, 19 milhões de deficientes. E não há uma política para eles, não há formas de integrá-los à sociedade?

Teresa Costa d’Amaral – Não há. Infelizmente, não temos políticas públicas e contribui para isso a invisibilidade da questão do deficiente e do próprio deficiente. Como o deficiente está, podemos dizer, escondido no quarto dos fundos da nossa casa, do Brasil, ele fica invisível e fica mais fácil ainda não ter políticas públicas. Precisamos estar no século 21 com políticas públicas direcionadas para a área. São inúmeras as dificuldades, as barreiras que existem. Acho que a sociedade começa a mudar, com o Parapan [Os Jogos Parapan-americanos] e com as Paraolímpíadas de Atenas, a perceber que o deficiente não precisa ficar escondido no quarto dos fundos, que ele pode vir para a sala, que ele faz bonito na sala, faz bonito em uma piscina, faz bonito lutando judô. Isso começa a mudar. Acho que, na nossa sociedade, nós não temos um fator que existe nos outros países. Nossa sociedade é amável, de certa forma. Então, ela acolhe o deficiente. Quando ela pode chegar perto do deficiente, ela o acolhe.

Mas precisa de informação.

Precisa de informação. Esse é o grande papel. Acho que o grande limitador da questão do deficiente é esse limitador da falta de circulação de informação, falta de produção também. Fizemos agora o nosso livro “Heroísmo sem limites” [do Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência] e ele é dos poucos livros bonitos que existem no Brasil sobre deficiência.

Temos que falar, ainda nem se tocou no assunto, do instituto ao qual você está à frente. O que acontece lá?

Lá é um sonho. É um sonho que transformamos todos os dias em realidade.

Cá para nós, é um sonho bem louco.

É louco, mas é bom. Nessa loucura boa, podemos acreditar que no Brasil existe solidariedade. Lá no IBDD [Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência} fazemos isso todo dia. Acho que nesse momento que o Brasil está passando, em que é tão difícil a solidariedade, é tão difícil construir para o bem comum, o IBDD é isso. Cada pessoa que chega lá é bem acolhida, sem marcar hora e sem cobrar nada. Temos poucos cursos de profissionalização, mas temos o suficiente para dar uma arrancada a quem precisa trabalhar.

Quais?

Temos informática básica, português básico, administração básico, para auxiliar de administração, inglês básico.

Até onde o seu trabalho tem a ver com Maria Aurora, sua irmã, que era deficiente?

Tem tudo. Ela tinha um sorriso muito bonito.

Que deficiência ela tinha?

Ela tinha paralisia cerebral. Nem engolir ela sabia.

Como ela se alimentava?

Minha mãe, “pacientíssimamente”, como meu pai escreveu, deixava a comida escorregar pela boca para que ela pudesse se alimentar. Os 12 anos que ela viveu, viveu bem dentro daquilo que ela podia viver.

Há outra história dura na sua vida, que foi o assassinato do seu irmão por um menor. Na época, era chamado de menino de rua. O que aconteceu com esse menino?

Ele virou adulto, meu pai nunca quis se aproximar dessa questão do rapaz que assassinou meu irmão. Ele preferiu lutar por uma política para mudar a vida dos menores – que na época ou era menor abandonado ou menor infrator.

Seu pai fez isso?

Fez isso. Ele conseguiu mudar a lei.

Seu pai perdoou o assassino do filho?

Perdoou. Foi uma grande batalha.

Você também lutou por uma lei.

Sim. É a lei 7853, que eu tenho alegria de ter escrito com minhas próprias mãos. Tenho muito orgulho dela, porque foi a primeira lei que disse que as escolas tinham que ser inclusivas, que o deficiente tinha direito a matrícula compulsória nas escolas, porque as escolas não aceitavam matrícula de deficiente. Até hoje existe esse problema. No entanto, já estamos querendo inventar roda e fazer um estatuto. Sou totalmente contra o estatuto.

Por quê?

Porque eu acho que o estatuto do deficiente é a Constituição brasileira. Queremos sair do lugar do diferente, queremos ir para o lugar da cidadania. Se a nossa Constituição garante o direito de ir e vir, ele precisa ser garantido para o deficiente, principalmente para o deficiente que tem problemas de locomoção. Nosso país não garante esse direito. Precisamos, realmente, que a lei maior brasileira – a Constituição – seja nossa lei. Não precisamos de novas leis, precisamos lutar para que as leis que existem sejam respeitadas e que cada cidadão brasileiro tenha construída sua cidadania em um país tão desigual. E que o deficiente faça parte dessa democracia.

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