21.9.07

O crime do Parapan

ANDREI BASTOS

Hoje, 21 de setembro, é o Dia Nacional de Luta das Pessoas com Deficiências. Há um mês, no dia 21 de agosto, foi declarada a morte cerebral do atleta argentino Carlos Maslup, medalha de bronze no Parapan.

Foi cometido um crime?

Tudo indica que sim e, por isso, é preciso esclarecer a trama sórdida em que resultou a realização dos Jogos Pan e Parapan-americanos de 2007 no Rio de Janeiro. No caso do Parapan está tudo muito evidente. O descaso foi tamanho que não existiu nenhuma preocupação em sofisticar a patranha e a situação é tão clara quanto a tranqüilidade com que o senhor Nuzman declarou publicamente, em programa de TV, que acha normal a previsão de gastos de 300 milhões com os Jogos pular para uma despesa de 3 bilhões de reais. É mole? Mesmo diante da alegação de que estariam de olho nas Paraolimpíadas de 2016, a diferença não reflete o que efetivamente foi realizado.

No que diz respeito às pessoas com deficiência, no Parapan ocorreu discriminação desde o início, quando o Comitê Paraolímpico Brasileiro, por mais críticas que se tenha a ele, foi excluído da organização dos Jogos de atletas com deficiência, podendo comparecer apenas como convidado. Sua participação era uma questão de princípio, mas acabou estrangeiro em seu próprio país.

A discriminação, em segundo movimento, apresentou a empresa de planos de saúde Golden Cross alegando que não estenderia o atendimento dado aos atletas do Pan aos do Parapan porque não desejava associar sua marca à imagem dos deficientes. O principal detalhe a ser esclarecido aí é: a Golden desrespeitou um contrato ou nem mesmo existia tal contrato, podendo o CO-Rio ser então responsabilizado por omissão de socorro, negligência ou coisa pior?

A discriminação, que também já tinha sido perpetrada na realização inadequada de muitas obras, como a calçada junto à cabeceira da piscina do Maria Lenk e a inexistência de boxes adaptados em todos os banheiros do Engenhão, continuou na transferência das cerimônias de abertura e encerramento para a Arena Multiuso, sob a alegação de que o Maracanã e o próprio Engenhão seriam grandes demais. Grandes demais para o público de 280 mil pessoas que compareceu às competições?

A discriminação foi em frente e se explicitou na debochada distribuição de apenas seis convites para cada uma das 18 instituições ligadas à questão das pessoas com deficiência no Rio, pois a abertura foi restrita a convidados, e ficou evidente, mais tarde, na falta de organização mínima, inclusive com a ausência de serviços de comunicação adequados e de público, ora vejam só!

A discriminação avançou em definitivo quando a festa de encerramento foi transferida novamente, desta vez para o interior da Vila Pan-americana, sem presença de público, voluntários ou convidados. Uma "festa" só para autoridades e atletas. Esses caras não dão moleza e já sabiam muito bem o que tinha acontecido com Carlos Maslup à hora do evento.

A discriminação enfim se transformou em tragédia quando chegou a triste desfecho com a morte do atleta tetraplégico argentino Carlos Maslup, que pode vir a ser o Édson Luís do movimento das pessoas com deficiência.

Dois pesos e duas medidas, para Pan e Parapan, estão mais do que evidenciados:

O esgrimista Ivan Schwantes, que teve o pulmão perfurado durante um treino no Pan, e o judoca Flávio Canto, que sofreu uma luxação no cotovelo em disputa do Pan, tiveram pronto atendimento no hospital Barra D’or, credenciado pela Golden Cross e que fica praticamente ao lado das instalações dos Jogos.

Já Carlos Maslup, que sofreu um AVC no último dia do Parapan, não teve a mesma sorte e ficou quase dez horas sendo levado pra lá e pra cá em ambulância do Corpo de Bombeiros, à procura de vaga em CTI e de equipe médica qualificada. Acabou internado no hospital Salgado Filho, no Méier, zona norte da cidade, onde veio a falecer.

Segundo o CO-Rio, este foi o mesmo tratamento que seria dado a atletas do Pan. Em quem devemos acreditar? Nos responsáveis pela organização dos eventos e da discriminação descritas acima ou nos fatos?

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