30.3.08

O Aero-Willys de Ney Trancoso

Direto da Redação, 30/03/2008:

O Aero-Willys de Ney Trancoso

ROBERTO PORTO

O diagramador Ney Trancoso Meirelles (1934-2008) já não está entre nós. Viajou para a eternidade no início de março e, agora, só eu integro o trio formado casualmente na porta de O Globo, na Rua Irineu Marinho (1876-1925) com a presença – rigorosamente sem graça – do doutor Roberto Marinho (1904-2003).

Inteiramente irresponsável, Ney, na portaria do jornal, quando me viu ao lado do doutor Roberto, gritou ‘fala Robertão…’ Cheio de vergonha, fingi que não era comigo, fugi para o estacionamento mas ainda vi o doutor Roberto acenando levemente com a mão para ele.

Mas as histórias do saudoso Ney não começam nem terminam por aí. Certa vez, na redação de O Globo, ele me contou que tinha comprado um Aero-Willys, que só lhe dava trabalho. Ney já não agüentava mais os enguiços do automóvel. Numa de suas viagens a Petrópolis – colaborava num jornal de lá – o trambolho enguiçou à margem da estrada. Ney decidiu abandonar o Aero-Willys ali mesmo e livrar-se dele definitivamente. Não teve sorte. Um colega de trabalho viu o carro, consertou o defeito e o devolveu ao irritado diagramador, que nem agradeceu o favor do colega.

De outra feita, seguindo para Friburgo, dirigiu o automóvel para a beira de um precipício e ia atirá-lo dentro de um rio (pulando fora antes, claro). A sorte também não lhe sorriu. Um casal que passava viu a cena, imaginou que Ney queria tirar o maldito Aero-Willys do perigo e o ajudou a recolocar a geringonça na estrada. O Aero-Willys parecia rigorosamente imortal. Por fim, percebendo que não poderia liquidar o possante, Ney o colocou numa oficina no subúrbio e nunca mais foi buscá-lo. A vitória lhe sorrira por fim.

Torcedor do Vasco da Gama – há muita gente boa no Direto da Redação que ama o chamado Clube da Colina – Ney ficava tenso quando no Maracanã jogavam Vasco x Flamengo. Certa vez, com o Vasco derrotado, ele deixou O Globo noite alta e foi a pé para casa, na Rua do Livramento.

Lá, obviamente, foi abordado por uma série de prostitutas que lhe propunham alguns momentos, digamos assim, de saliências. A cada uma que o abordava, Ney perguntava o time da preferência. Algumas eram Vasco, outras Fluminense e umas poucas Botafogo. Mas Ney – ele me assegurou – escolheu uma feia, mal ajambrada, só porque ela lhe disse que era Flamengo. Foi a maneira curiosa e estranha que ele se vingou do clube rubro-negro.

Folgado e mandão – não com Celso Itiberê, editor, e eu, subeditor – Ney Trancoso Meirelles – irritava os repórteres. Quando eles lhe perguntavam o tamanho de matéria que deveriam escrever, o diagramador era curto e grosso:

- Escreve 50 linhas que eu corto 20 aqui na hora de diagramar…

Por fim, em outra oportunidade – trabalhava também em O Dia – contou-me que um estagiário fora cobrir a inauguração de um circo e que ele deixasse pelo menos 40 linhas à espera. Quando o estagiário voltou, Ney cobrou-lhe a matéria e o estagiário foi simples e objetivo:

- Não houve inauguração. O leão fugiu da jaula, comeu umas três pessoas e o circo fechou…

Celso Itiberê, meu amigo e que hoje só faz automobilismo (sua paixão) para O Globo e Rádio Globo está aí mesmo para dizer que eu não conto mentiras.

Estou mentindo, Celso?

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