Estatuto da gafieira
O Globo, Opinião, 30/11/2007:
Estatuto da gafieira
TERESA COSTA D’AMARAL
No Brasil, tudo parece poder ser resolvido com a aprovação de um estatuto. Há anos insiste-se em resolver os problemas sociais da população negra com um Estatuto da Igualdade Racial e o conceito superado de raça, para dividir com a pele o que já é divido pela desigualdade social. E não podemos esquecer que, para o Estatuto do Desarmamento, tivemos até um plebiscito, onde o não era sim e o sim era não.
Como não consigo nem mesmo dialogar, quanto mais convencer do contrário os propositores e apoiadores de um Estatuto da Pessoa Com Deficiência, quero apresentar ao leitor uma mudança de estratégia pessoal. Vou abandonar minha forma de luta cotidiana por um Brasil mais justo para as pessoas com deficiência e fundar um Movimento Nacional por uma Nova Forma de Governabilidade. Acabamos com essa idéia de Constituição, leis infraconstitucionais, coerência legislativa, direitos iguais, brasileiros iguais. Proponho que o Brasil se concentre em aprovar estatutos, mas, desde já, fica combinado que não será preciso implementar nenhum deles. Basta tê-los sancionados, acreditar que eles resolveram todos os problemas e que o milagre aconteceu.
Começo com o Estatuto da Gafieira, lembram? Billy Blanco: quem “Subir na parede, dançar de pé pro ar, debruçar-se na bebida sem querer pagar ... será distintamente censurado e vai pra mão do delegado.” É extremamente adequado, poucos artigos, linguagem clara e direta, sem deixar margem a interpretações difíceis. Ouvi dizer que estão reinventando o Estatuto da Família. Vamos trabalhar nele. Também podemos pensar no Estatuto das Pessoas Com Passagens Aéreas e Sem Aeronave. E o Estatuto dos Com Crédito Consignado e Sem Salário no Fim do Mês será campeão em número de apoiadores.
E para termos tudo atualizado, proponho a reaprovação simbólica - eu não disse reprovação - do Estatuto da Criança, que nos deu o direito de ver crianças nas ruas cheirando cola, mas nos dá a consciência de ter um excelente Estatuto da Criança e do Adolescente.
Termino com a reaprovação do Estatuto do Idoso, definindo dessa vez se o idoso é o brasileiro com mais de 60 ou mais de 65 anos, para resolver uma das muitas confusões que o estatuto criou.
Desse modo, comemoro o 3 de dezembro, Dia Internacional da Pessoa com Deficiência, esperando que nossos legisladores tenham tantos milagres a realizar que esqueçam definitivamente o Projeto de Estatuto da Pessoa com Deficiência e ele caia no limbo dos projetos não-desarquiváveis e em total esquecimento.
TERESA COSTA D’AMARAL é superintendente do Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência (IBDD).
Estatuto da gafieira
TERESA COSTA D’AMARAL
No Brasil, tudo parece poder ser resolvido com a aprovação de um estatuto. Há anos insiste-se em resolver os problemas sociais da população negra com um Estatuto da Igualdade Racial e o conceito superado de raça, para dividir com a pele o que já é divido pela desigualdade social. E não podemos esquecer que, para o Estatuto do Desarmamento, tivemos até um plebiscito, onde o não era sim e o sim era não.
Como não consigo nem mesmo dialogar, quanto mais convencer do contrário os propositores e apoiadores de um Estatuto da Pessoa Com Deficiência, quero apresentar ao leitor uma mudança de estratégia pessoal. Vou abandonar minha forma de luta cotidiana por um Brasil mais justo para as pessoas com deficiência e fundar um Movimento Nacional por uma Nova Forma de Governabilidade. Acabamos com essa idéia de Constituição, leis infraconstitucionais, coerência legislativa, direitos iguais, brasileiros iguais. Proponho que o Brasil se concentre em aprovar estatutos, mas, desde já, fica combinado que não será preciso implementar nenhum deles. Basta tê-los sancionados, acreditar que eles resolveram todos os problemas e que o milagre aconteceu.
Começo com o Estatuto da Gafieira, lembram? Billy Blanco: quem “Subir na parede, dançar de pé pro ar, debruçar-se na bebida sem querer pagar ... será distintamente censurado e vai pra mão do delegado.” É extremamente adequado, poucos artigos, linguagem clara e direta, sem deixar margem a interpretações difíceis. Ouvi dizer que estão reinventando o Estatuto da Família. Vamos trabalhar nele. Também podemos pensar no Estatuto das Pessoas Com Passagens Aéreas e Sem Aeronave. E o Estatuto dos Com Crédito Consignado e Sem Salário no Fim do Mês será campeão em número de apoiadores.
E para termos tudo atualizado, proponho a reaprovação simbólica - eu não disse reprovação - do Estatuto da Criança, que nos deu o direito de ver crianças nas ruas cheirando cola, mas nos dá a consciência de ter um excelente Estatuto da Criança e do Adolescente.
Termino com a reaprovação do Estatuto do Idoso, definindo dessa vez se o idoso é o brasileiro com mais de 60 ou mais de 65 anos, para resolver uma das muitas confusões que o estatuto criou.
Desse modo, comemoro o 3 de dezembro, Dia Internacional da Pessoa com Deficiência, esperando que nossos legisladores tenham tantos milagres a realizar que esqueçam definitivamente o Projeto de Estatuto da Pessoa com Deficiência e ele caia no limbo dos projetos não-desarquiváveis e em total esquecimento.
TERESA COSTA D’AMARAL é superintendente do Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência (IBDD).
0 Comentários:
Postar um comentário
Assinar Postar comentários [Atom]
<< Página inicial