19.6.07

Palpite infeliz

ALEXANDRE GASCHI

Nos últimos anos, em razão de uma idéia de um senador da República, discutiu-se, em âmbito nacional, a criação do Estatuto da Pessoa com Deficiência. Como medida, causou grande impacto no segmento de pessoas com deficiência, que iniciaram acirrado debate sobre sua real necessidade.

Na realidade, desde os anos 1970, quando surgiram as primeiras leis, a exemplo da Emenda Constitucional 12, de 1978, a situação do segmento praticamente não se alterou, mesmo com o advento da carta magna de 1988, e com a publicação de vasta e excelente legislação infra-constitucional que assegura a inclusão social das pessoas com deficiência.

O problema continua sendo a ineficácia das normas e a inexistência de políticas públicas, como marco histórico de uma cultura viciada do país, em que seus representantes normalmente subordinam os interesses públicos aos seus próprios interesses, alijando as pessoas com deficiência de quaisquer oportunidades de terem sua inclusão social respeitada.

Este é exatamente o caso do tão comentado estatuto!

Após leitura do estatuto, depreendemos que fez-se apenas, e mal, cópia da legislação existente, sem que questões relevantes fossem disciplinadas. Exemplo disso é seu capítulo destinado aos transportes coletivos, que determina a elaboração de um regulamento sem a fixação de quaisquer prazos. Ora, o Decreto nº 5.296 que regulamentou a Lei de Acessibilidade nº 10.098, apesar de estabelecer prazos longos, disciplina a matéria sem a necessidade de qualquer outra norma que venha a estabelecer prazos novos e/ou mais extensos ou ainda suscitar interpretações que prejudiquem seu cumprimento.

Deve-se ter em mente que estatuto nada mais é do que uma lei ordinária auto-aplicável, dirigida à tutela, defesa e promoção dos direitos mais básicos de pessoas que fazem parte de uma camada excluída ou vulnerável da sociedade, sendo um diploma legal que disciplina uma proteção dos que necessitam, por ausência ou lacuna da legislação existente, ser protegidos por um diploma abrangente que trate da sua condição de fragilidade.

Não é nosso caso, o que precisamos é de eficácia legislativa para termos nossos direitos fundamentais assegurados.

No caso do citado estatuto, além de não ser o diploma adequado ao segmento, seus criadores fizeram um “recorta e cola”, onde partes de diversas leis e regulamentos existentes foram juntadas em uma ordem de assuntos e, pasmem, aprovada pelo Senado e em trâmite na Câmara, nesta casa liderado por deputado federal que, a exemplo do senador, parece que visa sua futura reeleição, situação comum para profissionais de uma política partidária arcaica.

As pessoas com deficiência economicamente ativas, como qualquer outro cidadão, querem somente a igualdade de oportunidades em todas as áreas, sendo certo que aquelas que dependem de uma proteção legal já estão protegidas pelos diversos diplomas existentes, sem exceção.

A legislação em vigor se presta exatamente a esse fim, partindo-se das normas gerais e diretrizes determinadas pela lei 7.853/89. Se não vemos avanços significativos até o momento, tal situação se deve à cultura do país no descumprimento das normas e não à falta delas.

O advento do estatuto não alteraria este quadro, muito pelo contrário, e somente prejudicaria a interpretação do que já existe com a norma posterior, dificultando sobremaneira a realização de ações e a diminuição do número, já ínfimo, de conquistas do segmento.

Na verdade, o que se constata é mais um movimento político visando a perpetuação no poder dos envolvidos na elaboração do estatuto. Se aprovado este diploma infeliz, tais profissionais de uma política – esta sim deficiente - serão marcados e reeleitos por serem os políticos que fizeram o Estatuto da Pessoa com Deficiência, que em nada suprirá a falta de cidadania vivenciada há décadas pelo segmento.

Apesar de toda a badalação em torno do famigerado diploma, lutemos para que ele seja derrubado e conquistemos alterações significativas na legislação existente para melhorarmos as condições de cidadania do segmento para, num futuro próximo, termos do que nos orgulharmos como resultados de nossas próprias escolhas.

Fonte: Site do IBDD (www.ibdd.org.br)

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