30.3.08

O Aero-Willys de Ney Trancoso

Direto da Redação, 30/03/2008:

O Aero-Willys de Ney Trancoso

ROBERTO PORTO

O diagramador Ney Trancoso Meirelles (1934-2008) já não está entre nós. Viajou para a eternidade no início de março e, agora, só eu integro o trio formado casualmente na porta de O Globo, na Rua Irineu Marinho (1876-1925) com a presença – rigorosamente sem graça – do doutor Roberto Marinho (1904-2003).

Inteiramente irresponsável, Ney, na portaria do jornal, quando me viu ao lado do doutor Roberto, gritou ‘fala Robertão…’ Cheio de vergonha, fingi que não era comigo, fugi para o estacionamento mas ainda vi o doutor Roberto acenando levemente com a mão para ele.

Mas as histórias do saudoso Ney não começam nem terminam por aí. Certa vez, na redação de O Globo, ele me contou que tinha comprado um Aero-Willys, que só lhe dava trabalho. Ney já não agüentava mais os enguiços do automóvel. Numa de suas viagens a Petrópolis – colaborava num jornal de lá – o trambolho enguiçou à margem da estrada. Ney decidiu abandonar o Aero-Willys ali mesmo e livrar-se dele definitivamente. Não teve sorte. Um colega de trabalho viu o carro, consertou o defeito e o devolveu ao irritado diagramador, que nem agradeceu o favor do colega.

De outra feita, seguindo para Friburgo, dirigiu o automóvel para a beira de um precipício e ia atirá-lo dentro de um rio (pulando fora antes, claro). A sorte também não lhe sorriu. Um casal que passava viu a cena, imaginou que Ney queria tirar o maldito Aero-Willys do perigo e o ajudou a recolocar a geringonça na estrada. O Aero-Willys parecia rigorosamente imortal. Por fim, percebendo que não poderia liquidar o possante, Ney o colocou numa oficina no subúrbio e nunca mais foi buscá-lo. A vitória lhe sorrira por fim.

Torcedor do Vasco da Gama – há muita gente boa no Direto da Redação que ama o chamado Clube da Colina – Ney ficava tenso quando no Maracanã jogavam Vasco x Flamengo. Certa vez, com o Vasco derrotado, ele deixou O Globo noite alta e foi a pé para casa, na Rua do Livramento.

Lá, obviamente, foi abordado por uma série de prostitutas que lhe propunham alguns momentos, digamos assim, de saliências. A cada uma que o abordava, Ney perguntava o time da preferência. Algumas eram Vasco, outras Fluminense e umas poucas Botafogo. Mas Ney – ele me assegurou – escolheu uma feia, mal ajambrada, só porque ela lhe disse que era Flamengo. Foi a maneira curiosa e estranha que ele se vingou do clube rubro-negro.

Folgado e mandão – não com Celso Itiberê, editor, e eu, subeditor – Ney Trancoso Meirelles – irritava os repórteres. Quando eles lhe perguntavam o tamanho de matéria que deveriam escrever, o diagramador era curto e grosso:

- Escreve 50 linhas que eu corto 20 aqui na hora de diagramar…

Por fim, em outra oportunidade – trabalhava também em O Dia – contou-me que um estagiário fora cobrir a inauguração de um circo e que ele deixasse pelo menos 40 linhas à espera. Quando o estagiário voltou, Ney cobrou-lhe a matéria e o estagiário foi simples e objetivo:

- Não houve inauguração. O leão fugiu da jaula, comeu umas três pessoas e o circo fechou…

Celso Itiberê, meu amigo e que hoje só faz automobilismo (sua paixão) para O Globo e Rádio Globo está aí mesmo para dizer que eu não conto mentiras.

Estou mentindo, Celso?

26.3.08

Nem toda unanimidade é burra

Informativo IBDD, 25/03/2008:

Nem toda unanimidade é burra
Representante do IBDD, Ana Cláudia Monteiro é eleita no Comdef-Rio

PAULO VITOR FERREIRA

No dia 8 de março, a gerente do Apoio à Pessoa do Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência (IBDD), Ana Cláudia Monteiro, foi eleita por unanimidade para a vaga na área de múltiplas deficiências do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência (Comdef-Rio). As eleições aconteceram no Centro Integrado de Atenção à Pessoa com Deficiência Mestre Candeia (CIAD), no Centro do Rio.

Representante do IBDD, Ana Cláudia Monteiro não teve dificuldades para vencer e recebeu os votos dos 107 eleitores presentes. Ela comentou um pouco sobre a sua total aceitação e a grande responsabilidade que assume a partir de agora.

“Fiquei um pouco surpresa e, ao mesmo tempo, muito feliz com o resultado. Ele mostra a aceitação dos meus cinco anos de trabalho no movimento. Agora, a minha responsabilidade aumentou. Não estou mais representando apenas o IBDD, que atende a pessoas com diferentes tipos de deficiência, e sim várias outras instituições. Tenho de estar atenta à necessidade de todos”, disse a unânime Ana Cláudia Monteiro.

Fonte: site do IBDD

24.3.08

Última edição do Repórter Esso - 1968

(Clique aqui e ouça a gravação)

* Colaboração: José Truda Jr.

23.3.08

Políticas Públicas de Juventude do RJ

Acontecerá nos dias 28 a 30 de março de 2008 a I Conferência Estadual de Políticas Públicas de Juventude do Rio de Janeiro. A comunidade de jovens com deficiência é especialmente convidada.

As inscrições para delegados(as) foram prorrogadas e estão abertas até o dia 25 de março de 2008.

O lema da Conferência é “Levante sua Bandeira!”.

Toda a Conferência vai contar com intérpretes de Libras (a Língua Brasileira de Sinais). Para os inscritos(as), será oferecido material pedagógico e alimentação (almoço e jantar).

(Clique aqui para obter a ficha de inscrição em PDF)

Dúvidas: (21) 2240-9951 e 2299-1756
www.social.rj.gov.br/juventude
Email: juventude@social.rj.gov.br

Não é preciso ser jovem pra se inscrever na Conferência (a proposta é que ela seja intergeracional).

Superintendência de Politicas para a Juventude - SEAS.DH:
Rua General Justo, 275 / 4º Andar/ Sala 403. CEP 20021-130 - Rio de Janeiro/RJ
Fone: (21) 2524-4104
Fax: (21) 2299-1756

22.3.08

Projeto de Lei de vereadora "chove no molhado"

Entrevista à Rádio CBN em 22/03/2008:

(Clique aqui e ouça a entrevista)

Transcrição:

CBN Rio. As notícias da nossa cidade, hoje com Aline Andrade.

Aline Andrade – A Câmara Municipal do Rio derrubou nesta semana o veto do prefeito César Maia ao Projeto de Lei de autoria da vereadora Silvia Pontes, do Democratas, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a acessibilidade das pessoas com deficiência e idosos com mobilidade reduzida em banheiros públicos. Para falar sobre esse assunto, nós convidamos o gerente de Comunicação do Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência, Andrei Bastos. Bom dia, obrigado pela participação.

Andrei Bastos – Bom dia, Aline. Bom dia, ouvintes da rádio CBN. Bom, nós consideramos este Projeto de Lei da vereadora Silvia Pontes uma bobagem. Porque ele é totalmente inócuo, porque nós já temos a Lei 10.098, que é a chamada “Lei da Acessibilidade”, de 2000, e nós temos também o Decreto 5.296, do presidente Lula, que foi assinado em 2004, que regulamenta essa “Lei da Acessibilidade”, trazendo tudo isso e muito mais. Essa acessibilidade nos banheiros públicos é uma coisa que já está prevista em lei há muito tempo, ou seja, a vereadora Silvia Pontes está “chovendo no molhado”. E é preciso dizer que ela preside na Câmara dos Vereadores a CPI do Parapan, que é uma CPI que apura as irregularidades ocorridas durante os Jogos Parapan-Americanos no Rio de Janeiro, e ela faria, na minha opinião, muito melhor se acelerasse os trabalhos dessa CPI para que fosse possível responsabilizar os culpados pelas irregularidades acontecidas.

Aline – Que irregularidades, por exemplo?

Andrei – Por exemplo, na última audiência, não sei bem o nome, dessa CPI, nós assistimos aos depoimentos do gestor dos Jogos, do Co-Rio, e dos bombeiros que prestaram atendimento tanto nos Jogos Pan-Americanos como nos Jogos Parapan-Americanos. E, naquele momento, ficou provado que houve crime de discriminação porque foi dispensado tratamento diferenciado no atendimento médico para os Jogos dos atletas sem deficiência e para os Jogos dos atletas com deficiência, que culminaram com a morte do atleta argentino Carlos Maslup.

Aline – Entendo. Andrei, você citou a “Lei da Acessibilidade” que já existe. Mas será que em algum momento a vereadora não quis, quando propôs e criou esse Projeto de Lei, não quis fazer valer, na verdade, o que já está posto pela própria Constituição, que estabelece direito igualitário a todos, mas que, na prática, a gente sabe que ainda existem muitas falhas?

Andrei – Não, Aline. Infelizmente, não é esse tipo de iniciativa que vai fazer valer o que já está posto. O que faz valer as leis que já existem é a fiscalização, que ela poderia fazer, a denúncia, a exemplo da CPI do Parapan, e o Poder Executivo também, né? Além, evidentemente, do Poder Judiciário. O IBDD entrou com uma Ação Civil Pública no dia 4 de junho do ano passado, justamente pelo descumprimento do decreto 5.296 na acessibilidade dos prédios públicos. E o IBDD já ganhou uma liminar na Justiça Federal com a Ação Civil Pública contra a União, o Estado e o Município.

Aline – As três esferas.

Andrei – As três esferas. Então, o IBDD já ganhou liminarmente, a juíza já determinou uma multa de 10 mil reais por dia por prédio público não adaptado. Durante esse processo, a União e o Estado atenderam às solicitações do processo, da juíza, e tudo mais. Para você ver como é a coisa, o Município não. O Município participou, até faltou a algumas audiências, e não entregou documentação nenhuma. Que documentação era essa? Eram as listas dos prédios públicos acessíveis e não acessíveis e cronogramas de obras para que eles se tornassem acessíveis. Quer dizer, a vereadora está, na minha opinião, querendo “vender” uma imagem de boazinha com os deficientes com esse Projeto de Lei que é inócuo, quando poderia estar cobrando do prefeito o cumprimento do decreto 5.296 nos seus prédios públicos.

Aline – O Estado entregou essa lista, o Município não?

Andrei – O Município não. Inclusive, a juíza determinou que o Município tivesse uma reunião extraordinária com o Ministério Público para tirar essa diferença e apresentar esses documentos e ficar em igualdade de condições com os outros entes federativos.

Aline – Andrei, se vocês têm um conhecimento, aí no IBDD, quais são os principais prédios públicos do Rio que nós temos carência de acessibilidade para as pessoas com deficiência?

Andrei – Aline, a quantidade de prédios públicos é muito grande. É tão grande, vai a milhares, entre 5 e 10 mil prédios. A quantidade é tão grande que nesse processo nós chegamos a um acordo com as partes, os entes federativos, para que fossem priorizadas as áreas que nós consideramos mais importantes. Quais são elas? Saúde, Educação e os prédios de atendimento ao público prioritário, como delegacias de polícia, cartórios, enfim, esses lugares do Detran onde as pessoas vão tirar documentos e por aí vai. Foi estabelecida uma hierarquia, e mesmo com essa hierarquia o Município não apresentou a sua lista. Então é difícil dizer, você tem exemplos que, se você for no Centro da cidade, para onde você se virar vai encontrar um prédio público inacessível. O prédio da própria Justiça Federal, onde nós demos entrada nessa Ação Civil Pública no dia 4 de junho do ano passado, é inacessível. Inclusive a juíza nos prometeu que está lá lutando para que ele seja tornado acessível o mais rápido possível. O nosso advogado, que usa cadeira de rodas, para dar entrada nessa ação teve que ser carregado por uma escadaria.

Aline – Essa liminar, essa conquista, por enquanto, de vocês, que ainda é em caráter liminar, o Município já recorreu, tem essa informação, Andrei?

Andrei – É, agora me fugiu, eu acho que um deles perdeu o prazo, eu acho que foi o Estado. Eles recorreram, mas não existe nenhum agravo. Eu não sou um entendido nessas questões jurídicas, mas por enquanto a liminar está valendo, nenhuma iniciativa, todos eles protestaram, mas nenhuma iniciativa deles foi em frente. Então está valendo o prazo, está valendo a multa, está valendo tudo.

Aline – A minha grande dúvida é a seguinte. Porque a gente sabe da lentidão da Justiça. Pode haver, não é o que a gente quer, mas pode haver uma guerra de liminares. Vocês ganham de um lado, Estado, União e o próprio Município recorrem do outro. Não há um entendimento, o Instituto já tentou conversar com todas essas esferas para haver um acordo fora da Justiça?

Andrei – Fora da Justiça não, Aline. Em primeiro lugar porque nós acreditamos na Justiça e temos o Ministério Público como um parceiro muito importante e muito empenhado na solução dessas questões. Nós chegamos e nós fizemos um acordo lá dentro, na Justiça, com o Ministério Público, com a União, com o Estado, com o Município e com a juíza, que foi esse acordo de estabelecimento das prioridades. Ou seja, o que nós pretendemos é que os três entes federativos promovam acessibilidade nesses prédios de Saúde, Educação e atendimento público prioritário, porque nós entendemos que, se isso for feito, serão exemplos que serão seguidos naturalmente por toda a sociedade. Será muito mais fácil promover a acessibilidade no resto dos prédios públicos, em todos os prédios em geral, quando essas coisas acontecerem, e é muito mais fácil de acontecer se você tem uma quantidade menor de prédios, e que são prédios exemplares.

Aline – Claro. E lembrando Andrei, você me corrija se eu estiver errada, nós temos de 10 a 14 por cento da população com algum tipo de deficiência, né?

Andrei – Pois é, Aline. Até quando você falou em acordo fora da Justiça, eu lembrei agora de uma outra coisa. O Rio de Janeiro vive uma situação terrível em termos de transporte público inacessível. Nós temos uma frota de aproximadamente 10 mil ônibus e apenas 48 ônibus adaptados, o que é uma piada de mau gosto. Isso é resultado justamente de um acordo que foi feito fora da Justiça entre a Prefeitura e as empresas concessionárias de transporte coletivo, que chegaram então a essa conclusão. “Nós vamos colocar um ônibus adaptado por cada empresa”. Ora, se uma mesma empresa detém ou controla várias linhas de ônibus, o que nós, pessoas com deficiências vamos ficar fazendo no ponto de ônibus? Vamos esperar a vida toda por um ônibus, né?

Aline – Há muitas coisas que ainda precisam ser corrigidas nessa área, não é Andrei?

Andrei – É. A começar pelo transporte público. Essa é a primeira coisa que tem que ser resolvida e o Município do Rio de Janeiro tem que acabar com essa vergonha, porque se a pessoa com deficiência tem o transporte público acessível, ela vai chegar na escola. E se ela chegar na escola, ela vai poder cobrar acessibilidade na escola. Ela vai poder chegar no trabalho, ela vai poder ir a todos os lugares. Então as outras coisas virão naturalmente.

Aline – Tá certo. Andrei, muito obrigada pela presença aqui no CBN Rio deste sábado, um bom final de semana para você.

Andrei – Eu que agradeço, Aline, a oportunidade, e espero que a vereadora Silvia Pontes acelere os trabalhos da CPI do Parapan.

Aline – Aguardamos notícias aqui no CNB Rio também. Conversei com Andrei Bastos, gerente de Comunicação do Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência.

Despedida de ouro

O Globo, Panorama Esportivo, 22/03/2008:

Despedida de ouro

Cego, o judoca Antônio Tenório, dono de três medalhas de ouro nas Paraolimpíadas de Atlanta-1996, de Sydney-2000 e de Atenas-2004 na categoria até 100kg, será personagem de documentário. "Tenório em Pequim" é produzido pelo Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência (IBDD), com o patrocínio da Oi Futuro. Será exibido no Brasil e na China.

Paulista de São Bernardo do Campo e uma das estrelas consagradas da história paraolímpica, Antônio Tenório, de 37 anos, certamente disputará sua última Paraolimpíada em Pequim. Quando começou no judô, aos sete anos, ele enxergava bem. Mas, aos 13, perdeu a vista esquerda, ao se acidentar, brincando com uma atiradeira. Seis anos depois, uma infecção na vista direita deixou-o totalmente cego.

21.3.08

A última grande luta

The Boston Globe, 27/02/2008:

A última grande luta

DON AUCOIN

É um dia duro e frio nas ruas rudes desta cidade rude, mas Keith P. Jones sai com sua cadeira de rodas motorizada, abrindo caminho até seu restaurante favorito. É claro, Jones avançava contra o vento.

Foi assim durante toda sua vida, de um modo ou de outro.

Quando se nasce com paralisia cerebral, é preciso lutar constantemente contra as baixas expectativas dos outros. Quando se é negro e em uma cadeira de rodas, é preciso combater a suposição de que você é vítima de violência de gangues. Quando se é inteligente de formas que o mundo não vê, é preciso fazê-lo enxergar.

É mais fácil dizer do que fazer, como Jones, 38 anos, é o primeiro a reconhecer. "Quando eu era garoto, não havia exemplos reais para jovens com deficiências, especialmente jovens afro-americanos com deficiências, nenhum senso de que poderia crescer e me tornar um Barack Obama", ele disse. "Mesmo agora, ainda não há."

Ele está prestes a mudar isso. Jones despontou como um forte ativista pelos direitos dos deficientes, discutindo com legisladores, educadores, executivos e qualquer um que escute que a causa das pessoas com deficiências é a próxima fronteira dos direitos civis. "É a última grande luta", ele disse.

Após anos lutando por mudanças na política educacional, nas regras nos locais de trabalho e na postura pública em relação aos deficientes, Jones está considerando uma campanha ao Senado dos Estados Unidos como forma de trazer mais atenção ao assunto. "Nós estamos perpetuamente criando uma subclasse", ele insiste. "Nós estamos perpetuamente subeducando um grupo de pessoas. Nós não somos vistos como parte da força de trabalho. Nós somos vistos como um fardo."

Apesar de sua intensidade e senso de missão, Jones ri com facilidade e com freqüência, e um alvo favorito é ele mesmo. Um compositor, produtor e artista de hip-hop, ele lançou dois CDs de músicas próprias. "Eles ganharam pau", ele diz ironicamente. "Nem disco de ouro, nem de platina. De pau." Ele e sua esposa, Kerlyne Pacombe Jones, estão esperando um filho para daqui dois meses. Kerlyne é cega. "Eu sou os olhos dela, ela é minhas mãos", ele explicou.

Para alguns, Jones se tornou uma espécie de exemplo para os jovens deficientes que ele carecia em sua juventude. Como consultor especializado em questões de deficiência para comunidades de minorias, ele aproveita toda oportunidade para usar sua própria história para inspirar jovens deficientes e tranqüilizar seus pais, abrindo seus olhos para o que é possível. "Ele é destemido. Ele simplesmente segue em frente", disse Richard Robinson, diretor executivo da Federação das Crianças com Necessidades Especiais, que escolheu Jones para fazer o discurso de abertura de sua conferência no sábado, em Boston. "Ele parece ter uma confiança em si mesmo que é algo digno de ser admirado por todos. O restante de nós bem que gostaria de ser alguns dias assim."

"Para muitos pais, há sempre o temor de como a sociedade aceitará seu filho", acrescentou Robinson. "Keith simplesmente acaba com isso em um minuto."

Mas se Jones transmite uma mensagem animadora, ela não vem adocicada. Ele já passou por muita coisa para permitir isso, e já teve muitos confrontos com "pessoas que insultavam minha capacidade, ou tentavam me colocar em uma caixa".

Filho único de mãe solteira, ele passou seus primeiros anos em Saint Louis. "Minha mãe fez um trabalho incrível", disse Jones, balançando a cabeça. "Eu disse ontem para ela: 'Eu nunca vou poder pagar o que você fez, mesmo se tivesse o dinheiro do Bill Gates."

Seu pai, entretanto, foi uma história diferente. "O relógio de culpa dele tocava a cada seis anos", lembrou Jones. "Era, 'Oh, ele está com 12 anos, vou telefonar para ele. Oh, ele está com 18, vou telefonar para ele'" Em um desses telefonemas, ele disse, seu pai colocou na linha duas outras pessoas: as filhas que teve com outra mulher. Jones não conseguiu deixar de se perguntar se sua deficiência contribuiu para a aparente indiferença de seu pai em relação a ele. "Se pareço um homem amargo, é porque sou", ele admite.

Mas sua mãe sempre esteve lá, firme como uma rocha. Em Saint Louis, ele se tornou um dos primeiros alunos deficientes a ser integrado na escola normal, graças à persistência dela. Por toda a infância dele, a meta constante dela era a de que ele aprendesse as lições difíceis da independência. "Minha mãe pensava: 'Ele não ficará em uma oficina protegida. Ele não ficará pregando botões em caixas'", disse Jones.

Mas mesmo sua mãe não podia protegê-lo de seus colegas de classe, especialmente quando se mudaram para Ithaca, Nova York, quando ele tinha 7 anos. Sendo uma pessoa com uma desordem neurológica que prejudica a coordenação muscular e o movimento do corpo, e sendo um dos poucos estudantes negros, ele era um alvo. "As crianças são cruéis", disse Jones. "Era: 'Por que você é assim? Por que você fala assim? Por que você baba? O que aconteceu com você? ' Tudo o que você possa imaginar era atirado em mim." Inclusive, ele disse, ofensas raciais. Adultos bem-intencionados também escorregavam às vezes, se referindo a ele como "o adorável garotinho aleijado".

Aos 12 anos, quando ele e sua mãe se mudaram para Boston, Jones começou a se virar sozinho. Ele demonstrou excelência em matemática e ciência. Ele desenvolveu um amplo círculo de amigos. Quando ele disse que queria aprender chinês, sua mãe encontrou um curso da língua no Instituto de Tecnologia de Massachusetts. Ela o matriculou em um curso de arte no Museu de Belas Artes, e até mesmo conseguiu para ele um papel em uma montagem de "O Quebra-Nozes".

Mas mesmo enquanto ele tentava expandir seu mundo, alguns tentavam encolhê-lo, à medida que os preconceitos de raça se somavam aos preconceitos sobre deficiência. Com a violência das gangues crescendo nas ruas de Boston, estranhos olhavam para o jovem negro em uma cadeira de rodas e perguntavam: "Quando você foi baleado?" (Uma pergunta que lhe fazem até hoje.) Ao se aproximar da formatura no colégio West Roxbury, nutrindo a ambição de se tornar um engenheiro aeronáutico, ele obteve notas altas apesar da carga de trabalho que incluía cálculo, trigonometria, geometria e vários outros cursos. Mas certo dia, um professor o chamou de lado e lhe disse que, por causa da má ortografia, Jones teria que ser retido no colégio por mais um ano.

Nem ele e nem sua mãe aceitaram aquilo. Ele foi em 1988 para o Ramapo College, em Nova Jersey, conhecido por ser acessível aos deficientes. Lá ele se tornou cada vez mais politizado e escreveu artigos de opinião para o jornal do campus (argumentando, por exemplo, que o petróleo era o motivo da primeira Guerra do Golfo). Ainda assim, foi apenas em 1997, quando ele começou a trabalhar no Centro para Vida Independente de Boston, que se tornou plenamente ciente de que havia um movimento pelos direitos dos deficientes. Ele se lançou naquilo, reconhecendo imediatamente como sendo um antídoto potencial para o senso de isolamento que muitos deficientes sentiam.

Jones se tornou um consultor que treina pessoal da linha de frente em escolas e organizações sem fins lucrativos sobre os problemas enfrentados pelos deficientes, especialmente no que chama de "populações historicamente má atendida": afro-americanos, latinos, ásio-americanos, imigrantes recentes e idosos. Sua empresa, a SoulTouchin' Experiences, também envolve produção musical e palestras. "Eu transformei tudo o que faço em uma empresa", ele disse. "Coloquei tudo sob o mesmo guarda-chuva."

Também sob o "guarda-chuva" se encontra a luta persistente pelas mudanças políticas que considera necessárias. Por exemplo, Jones defende um financiamento pleno do Capítulo 766, a lei de ensino especial, e por sessões regulares de conscientização da deficiência para professores e administradores escolares, para que possam entender melhor os problemas enfrentados pelos alunos deficientes. "Nós precisamos entender que todas as crianças - independentemente de estarem em um respirador artificial, em uma cadeira de rodas, ou sofrerem de dislexia - todas têm capacidade de aprender", ele disse. Os empregadores também precisam abandonar os preconceitos sobre o que pessoas com deficiências são capazes de fazer, ele acrescentou, uma tarefa que está se tornando mais urgente pelo fato de muitos veteranos da guerra no Iraque estarem voltando para casa com algum tipo de invalidez.

Jones é tanto visível quanto falador, mas ele sabe que isto está longe de representar todos os deficientes. "Para cada pessoa como Keith Jones, há cerca de 20 que você não vê", ele disse. Talvez seja o motivo para ele se recusar a desacelerar, o motivo para estar considerando concorrer ao Senado, apesar de admitir que "não tem ilusões" sobre suas chances. Ele nutre ambições de ser um ator. Ele acabou de finalizar um novo CD. Ele é altamente requisitado como palestrante em escolas e organizações comunitárias. De uma forma ou de outra, Jones está usando sua voz para divulgar uma mensagem que ele acha que as pessoas precisam ouvir.

"É uma declaração de que independentemente da deficiência, eu posso fazer isto", ele disse. "Independentemente de nossas deficiências, nós podemos fazer isto."

Tradução: George El Khouri Andolfato

Visite o site do The Boston Globe

* Colaboração: Milton Coelho da Graça

Dia Internacional da Síndrome de Down

Atividades em todo o país marcam o 21 de março - Dia Internacional da Síndrome de Down

Secretaria Especial dos Direitos Humanos - Presidência da República - http://www.presidencia.gov.br/estrutura_presidencia/sedh/noticias/ultimas_noticias/MySQLNoticia.2008-03-19.4535

Uma série de atividades em todo o país marcam nesta semana a celebração do Dia Internacional da Síndrome de Down, 21 de março. Ao contrário do que muitos pensam, não se trata de uma doença, é uma ocorrência genética natural e universal, que está presente em todas as raças e classes sociais. Portanto, as pessoas com síndrome de Down não são doentes, não sofrem de, não são vítima de, ou padecem ou são acometidas por síndrome de Down. A estimativa é de que a cada 700 nascimentos, um bebê tenha a síndrome. Enquanto em 1947 a expectativa de vida de uma pessoa com Down era entre 12 e 15 anos, atualmente, é comum pessoas com a síndrome chegarem aos 70 anos.

Na agenda consta a chegada do site Down21 Brasil, uma das principais referências na atualidade sobre o assunto. Com o tema “Sonhe Alto o Bastante”, o site traz informações sobre a síndrome – Down21 Brasil, e a campanha pela ratificação da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência como emenda constitucional.

“A página eletrônica contribui para o enfrentamento da exclusão, pois mostra os avanços das pessoas com a síndrome, “hoje já temos pessoas com Down na faculdade”, avalia Izabel Maior, responsável pela Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República (SEDH/PR).

“Este ano o Brasil também tem muitos avanços a comemorar e pode dar um belo exemplo ao resto do mundo”, comemora a coordenadora do Down21 Brasil, Patrícia Almeida. “Registramos um aumento no número de matrículas de crianças com síndrome de Down incluídas na rede regular de ensino, junto com todas as crianças”, exemplifica ela.

A programação completa dos eventos nos estados pode ser encontrada no endereço http://dfdown.blogspot.com/.

Fonte: iNFOATiVO DEFNET

19.3.08

Boicote à abertura dos Jogos de Pequim

Repórteres Sem Fronteiras pedem que autoridades não compareçam

Em mensagem endereçada a chefes de Estado, líderes de governo e integrantes de famílias reais, a organização Repórteres sem Fronteiras (RSF) pediu às autoridades que não compareçam à cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de Pequim, no dia 8 de agosto. O boicote seria motivado pelo cerceamento à liberdade de expressão na China, bem como pelo desrespeito aos direitos humanos.

"A China não cumpriu nenhuma das promessas feitas em 2001, quando Pequim foi escolhida como sede. Em vez disso, o governo está esmagando os tibetanos. Políticos do mundo todo não podem ficar em silêncio diante disso. Um boicote geral dos Jogos não seria uma boa solução; seria injusto com os atletas. Mas é vergonhosa a ausência de demonstrações contra os abusos chineses", provoca a RSF. "Aqueles que acham que as Olimpíadas devem andar de mãos dadas aos direitos humanos não podem ficar calados".

Cerca de cem jornalistas e blogueiros estão presos na China por manifestarem posições contrárias ao governo. O RSF já promoveu manifestações e até lançou uma bandeira contra os abusos chineses. A causa defendida pela organização já tem dois apoios de peso. O Príncipe Charles, do Reino Unido, e o Parlamento Europeu não pretendem ir ou ser representados na cerimônia.

Fonte: Comunique-se (www.comunique-se.com.br)

A polêmica começou com o Príncipe Charles

No final de janeiro, o príncipe Charles, herdeiro da Coroa Britânica, informou à organização Tibet Livre que não estará presente na cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos de Pequim este ano. A informação foi divulgada por um porta-voz do grupo. “O príncipe de Gales não estará presente à abertura das Olimpíadas de Pequim nem pretende ser representado na cerimônia”, disse o porta-voz.

A organização, que tem sede em Londres e denuncia os abusos dos direitos humanos no Tibet, afirmou que escreveu ao príncipe de Gales - que apóia o Dalai Lama, líder espiritual dos tibetanos - para pedir a ele que não assistisse à cerimônia.

Em resposta, a organização recebeu uma carta do subsecretário privado do príncipe, Clive Alderton, na qual confirmou que Charles não estará presente na cerimônia de abertura dos Jogos de Pequim, que serão realizados de 8 a 24 de agosto.

No texto, Alderton acrescentou que o príncipe sempre teve interesse no Tibet e se reuniu várias vezes com o Dalai Lama. Um porta-voz do Tibet Livre expressou sua satisfação com a decisão do príncipe e pediu a outros políticos que façam o mesmo.

“Os abusos contra os direitos humanos em Tibet pioraram desde que os Jogos foram concedidos, em 2001. Estes Jogos serão conhecidos como os Jogos da Vergonha”, acrescentou.

Na última semana de janeiro, a imprensa divulgou um pedido do Dalai Lama para que os tibetanos e seus seguidores realizassem protestos pacíficos durante os Jogos Olímpicos. Na Inglaterra, os jornais britânicos ressaltaram que a medida pode ser um revés para os esforços do Governo do Reino Unido de manter laços econômicos e culturais com a China.

Fontes: Agências internacionais (AFP, EFE e outras), blogs de O Globo e site Globoesporte.com

Parlamento Europeu quer o boicote

A polêmica sobre o boicote às Olimpíadas de 2008, em Pequim, por conta da instabilidade no Tibet e em outras províncias chinesas, parece não ter fim. Na terça-feira passada, o presidente do Parlamento Europeu, o alemão Hans-Gert Poettering, afirmou que a Europa deve mandar um "sinal" a Pequim, como renúncia dos líderes políticos em participar da cerimônia de abertura dos Jogos.

Entrevistado pela rádio alemã Deutschlandfunk, Poettering disse que "é muito cedo para dizer como as coisas irão terminar", ressaltando que "é necessário ter todas as opções em aberto".

O presidente do Parlamento europeu, membro dos conservadores da União Democrata-Cristã (CDU), da chanceler Angela Merkel, comentou que a Europa não pode ficar apenas olhando:

“Não podemos concordar com aquilo que está acontecendo no Tibet. Os chineses devem saber disso. Precisamos dizer aos chineses que, se esta repressão continuar assim, haverá uma reação. Os representantes políticos que querem ir à China para assistir à abertura dos Jogos Olímpicos, como eu mesmo planejei fazer, deverão se perguntar se uma viagem dessas irá representar um comportamento responsável”, disse Poettering.

Fonte: Globoesporte.com e agências de notícias

Cesar x TV Globo

Jornal do Brasil, Informe JB, 19/03/2008:

Cesar x TV Globo

O prefeito do Rio, Cesar Maia, comprou uma briga grande. O filho Rodrigo Maia, presidente do DEM, foi à cúpula da TV Globo: "Papai mandou avisar que, se vocês continuarem dando porrada nele, vai anunciar apoio ao Crivella". O senador do PRB lidera a corrida pela prefeitura.

17.3.08

Quanto vale o médico?

A situação dos médicos do Estado não é nenhuma novidade, mas as pessoas em geral não têm idéia da realidade na qual vivem estes profissionais. Todo mundo sabe como se encontra o Sistema Público de Saúde do Rio de Janeiro, mas pouquíssimo se fala sobre as condições de trabalho do médico. Falta de medicamentos, leitos e equipamentos, além de nenhum aumento justo de salário há muitos anos, são apenas alguns exemplos.

O Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro - CREMERJ lançou a campanha “Quanto Vale o Médico” para estimular discussões sobre o assunto e fortalecer iniciativas e soluções para esta questão. A população cresce, a violência urbana aumenta e a estrutura de saúde do Rio encontra-se estagnada. O resultado desta situação faz com que o médico esteja simplesmente impossibilitado de exercer seu trabalho da melhor maneira e a população acabe sofrendo com um serviço de saúde perigoso e decadente.

Quanto vale o médico?” é a pergunta-chave desta campanha. Faça esta pergunta a você mesmo e passe adiante, para amigos, familiares, colegas. É assim que vamos poder dar vida a esta iniciativa e, mais importante, aprender a valorizar o profissional que cuida da saúde das pessoas.

(Clique aqui, saiba mais e participe do abaixo-assinado)

A atualidade da política democrática

FAP realiza seminário sobre Declaração de 58 nos dias 28 e 29 de março

A Fundação Astrojildo Pereira (FAP) realiza nos dias 28 e 29 de março, na cidade do Rio de Janeiro, um Seminário Nacional reunindo políticos, intelectuais e demais interessados em política para relembrar a Declaração Política de Março de 1958, lançada pelo então Partido Comunista Brasileiro (PCB). O evento pretende não apenas destacar a importância histórica do documento, mas examinar as razões dele determinantes, a possível vigência dos posicionamentos de então e identificar quais seriam os pressupostos de uma possível Declaração Política de Março de 2008.

O ato solene de abertura será no dia 28 (sexta-feira), às 18 horas, no auditório da Associação Brasileira de Imprensa (Rua Araujo Porto Alegre, 71 – Centro). O local foi escolhido para homenagear a ABI, pelo seu primeiro centenário de fundação, e o seu atual presidente, jornalista Maurício Azedo. Às 19 horas, os presidentes da FAP (Stepan Nercessian) e do Partido Popular Socialista (Roberto Freire), comporão a Mesa de intelectuais e políticos (o jornalista e ex-dirigente partidário Armenio Guedes, o único redator vivo do documento, será um dos expositores) que vão debater Razões determinantes da Declaração de Março de 1958 e sua importância histórica.

No dia seguinte, 29 (sábado), num dos auditórios do Hotel Novo Mundo (Praia do Flamengo, 20), haverá as Mesas de Debates: das 9h às 13h – O Brasil de hoje e a validade das idéias da Declaração de 1958; das 15h às 19h - Idéias para uma Declaração de Março de 2008.

A FAP também preparou um site (clique aqui e acesse) sobre o evento com informações sobre o seminário e um fórum de discussão e troca de idéias.

Ponto final

O Globo, Ancelmo Gois, 17/03/2008:

Ponto final

Sexta, para uma platéia de 1.200 fiscais da Receita, em Curitiba, onde foi homenageada, a ex-deputada Denise Frossard voltou a dizer que não é candidata a prefeita do Rio:

- Não sou candidata a nada. E não há chance de vir a ser.

16.3.08

Barack Gabeira

Revista Veja, edição 2052, 19/03/2008:

Ensaio: Roberto Pompeu de Toledo

Barack Gabeira

O candidato da mudança nas eleições municipais deste ano está na disputa do Rio de Janeiro

"Yes, we can" (Sim, nós podemos) é o slogan de maior sucesso da temporada, nos Estados Unidos. Está escrito nos cartazes do candidato Barack Obama e é entoado em coro por seus partidários. Podemos o quê? Isso é o de menos. A força do slogan está em não ser específico. Invoca a eficácia da vontade ("podemos") e as virtudes da união ("nós") e dá oportunidade para que cada um preencha a seu gosto o espaço reservado ao que pode ser obtido com tal conjunção de forças. A mensagem central é que um novo horizonte é possível. Guardadas todas as proporções entre um país e outro e entre uma eleição e outra, a chancela de esperança representada pelo yes, we can vai, nas eleições municipais programadas para este ano no Brasil, para o deputado Fernando Gabeira, que na semana passada anunciou sua candidatura a prefeito do Rio de Janeiro.

Gabeira, que já era das figuras mais interessantes, virou uma das figuras mais respeitadas da política brasileira. Memorável foi sua interpelação, no plenário da Câmara, contra a "maneira indigna" com que se comportava o então presidente da casa, Severino Cavalcanti. Filiado ao Partido Verde, teve sua candidatura a prefeito apresentada por uma coligação que inclui o PSDB e o PPS. Ele tem a singularidade de guardar distância do PT, ao qual já foi filiado, sem aderir aos ultras do lado contrário. No ato de lançamento da candidatura, até convidou o PT a aderir à coligação. Por suas posições e sua personalidade, representa um traço de união, um hífen, entre o PT e o PSDB, os dois partidos que encabeçam as disputas de poder, nacionalmente. Vem daí o primeiro sinal de yes, we can que sua candidatura emite: sim, nós podemos romper a muralha de intransigência que separa PT e PSDB. Podemos desmanchar uma dicotomia que tem beneficiado principalmente a rataria espalhada pelos partidos-satélites, contemplada com a sorte grande de vender cada vez mais caro o apoio necessário para que um ou outro lado componha a maioria.

Não se espera uma aliança em nível federal, pelo menos até onde a vista alcança, entre PT e PSDB. Também são escassas as possibilidades de isso acontecer nos estados, e certamente não vai se repetir em outras capitais o que se esboça em Belo Horizonte, onde o governador Aécio Neves, do PSDB, e o prefeito Fernando Pimentel, do PT, articulam lançar um candidato comum. O que dá para esperar, com a articulação mineira, se der certo, e mais ainda se a ela se somar a subida de Gabeira ao primeiro plano do cenário nacional, é um impulso em direção ao degelo que possibilite colaboração pontual entre os dois partidos e acordos no Congresso. Com boa vontade e ajuda dos astros, yes, we can. Quem tem mais a perder são os agentes da corrupção e da chantagem.

Outro sinal de "sim, podemos" são as condições impostas por Gabeira aos companheiros de coligação para aceitar a candidatura: (a) não sujar a cidade nem agredir os adversários durante a campanha; (b) se eleito, disponibilizar as contas da prefeitura na internet; (c) não usar o cargo para fazer oposição aos governos federal ou estadual; e (d) não aceitar indicações políticas para a formação do secretariado. Eis um programa de tirar o fôlego, de tão revolucionário, em face dos costumes vigentes. A começar pelo fato de o candidato se dispor a ser cobrado já na campanha: se sujar a cidade ou aplicar golpes baixos contra os adversários, os eleitores estão convidados a não votar nele. Não sujar as ruas bem poderia ser condição preliminar para todos os candidatos, ainda mais quando se trata de eleição em que o que está em jogo é a administração do município. Ainda não chegamos a tanto. Um candidato que venha a fazê-lo, no Brasil, por vontade própria merecerá figurar nos anais como autor de um feito histórico. (Em São Paulo, é de esperar que a cidade fique limpa, mas não será pela vontade dos candidatos: é porque existe uma lei que proíbe as faixas e os cartazes.)

Mas a mais revolucionária entre as revolucionárias condições impostas por Gabeira é a de não aceitar indicações políticas para o secretariado. Enfim, eis um governante que se dispõe a governar. O titular de um cargo executivo, no Brasil, é um oprimido. Está condenado à sina de aceitar colaboradores que não conhece e cujo preparo para as funções nem a própria senhora consorte do indicado seria capaz de atestar. Não é absurdo imaginar o presidente Lula a cruzar na rua com um dos titulares de seu caudaloso ministério sem ligar o nome à pessoa. Gabeira acena com nada menos do que um chamamento à libertação. "Presidentes, governadores e prefeitos, não tendes nada a perder senão vossos grilhões." Yes, we can. Podemos formar equipes só com base na competência.

Se Gabeira conseguir tal proeza, terá mudado o eixo em torno do qual gira a política brasileira. Mas o "nós podemos" com que acena sua candidatura não será vão mesmo com resultado mais modesto: fazer política de modo decente já é uma grande coisa.

14.3.08

PT é Crivella

Jornal do Brasil, Informe JB, 14/03/2008:

PT é Crivella

O senador Marcelo Crivella (PRB-RJ) conversou muito com o presidente do PT, Ricardo Berzoini, ontem e anteontem. Candidato à prefeitura do Rio, Crivella quer o PT como aliado no Rio.

PT é Crivella 2

O acordo foi fechado. Se Crivella, que hoje lidera as pesquisas, for para um eventual segundo turno, o PT está com ele.

13.3.08

O candidato da Globo

Jornal do Brasil, Informe JB, 13/03/2008:

O candidato da Globo

A direção da TV Globo do Rio recebeu do Ibope números quentes que provam a ascensão desenfreada de Marcelo Crivella na disputa pela prefeitura. O senador é ligado à Igreja Universal e à Rede Record. A cúpula da Rede Globo decidiu investir na candidatura de Fernando Gabeira pela frente PV-PPS-PSDB.

11.3.08

Nota política oficial - PPS

Rio de Janeiro, 10 de março de 2008:

Em reunião das Executivas Estadual e Municipal/Rio do PPS, nesta data, com a participação de representante da Direção Nacional do partido, ficou aprovada por consenso a constituição da Frente Carioca, atualmente composta por PPS, PSDB e PV, e o nome do deputado federal Fernando Gabeira como candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro.

PPS - Partido Popular Socialista

9.3.08

"Trazer ao Rio o que deu certo"

O Dia, 09/03/2008:

Entrevista com Gabeira:

"Trazer ao Rio o que deu certo"

O mais novo pré-candidato a prefeito quer adaptar soluções que funcionaram em outras cidades do mundo e diz que a oposição entre direita e esquerda é coisa do século passado, que não corresponde mais à realidade

Paulo Celso Pereira

Segunda-feira o quadro eleitoral do Rio sofreu uma reviravolta com o anúncio da pré-candidatura de Fernando Gabeira (PV) à prefeitura. Deputado federal mais votado no estado em 2006, com 293 mil votos, ele saiu como o nome de consenso da Frente do Rio, que reúne PV, PPS e PSDB. Ex-militante do PT, de onde saiu em 2003 por discordar da atuação do partido no governo, Gabeira quer fazer uma campanha propositiva, sem ser necessariamente de oposição à gestão de Cesar Maia.

—Já é possível falar dos pontos da sua campanha?
—Claro. Um deles é o crescimento econômico, em parceria com a iniciativa privada, como fazem cidades como Nova Iorque. Todo esse complexo que abrange o porto do Rio e o Centro tem que chegar ao fim do governo recuperado. Outro tema é a segurança. Mesmo a prefeitura não sendo a responsável imediata pela segurança, pretendo estabelecer um comando tripartite com os governos federal e estadual, no qual a nossa participação seria muito mais de produzir informações e inteligência.

—A Guarda Municipal não é armada. O senhor pensa em mudar isso?
—Não tem projeto definido ainda, estamos discutindo. Houve experiências em cidades como Vitória, mas só depois de um preparo psicotécnico muito severo. Minha preocupação principal é adotar instrumentos de comunicação rápida. Mas o tema está aberto para discussão.

—O que significa ‘produzir informações’?
—A cidade tem muitas câmeras que controlam o trânsito e vai ter outras. A prefeitura é uma máquina de informação. Mas há um setor a investir para processar essa informação e escolher o que é importante para a segurança. Outro trabalho é em áreas de risco. Pode-se atuar pedagogicamente, preparando as pessoas para não serem tão vulneráveis. Nova Iorque tinha uma incidência muito grande de assaltos no metrô e criou uma equipe que preparou os passageiros.

—Os três partidos da frente — PV, PPS e PSDB — participaram, em algum momento, dos 12 anos da gestão Cesar Maia. Será oposição ou continuidade?
—É uma candidatura com perspectiva de recuperar a cidade e tentar aprender com os erros da administração atual. E que vai, sobretudo, buscar o maior espaço possível para a sociedade. A principal característica é a perspectiva do diálogo.

—Mas vai haver uma candidata do governo. Sua candidatura seria de oposição?
—Vivemos uma crise profunda no Rio, ser oposição ou governo é secundário. O importante é criar uma base de salvação. Eu posso até fazer oposição, se precisar. Mas num barco à deriva, se ficar todo mundo brigando... Então vou contribuir com todos os candidatos, para que qualquer eleito tenha condições de resolver a parada.

—Como serão as relações com o estado e a União?
—As mais harmônicas possíveis. Se você conjuga o esforço federal, o estadual e o municipal, tem possibilidade de andar muito mais rápido. Não é possível se recusar a andar mais rápido só porque existe alguma discrepância, política ou temperamental. Tentarei desenvolver o mesmo modelo que hoje é desenvolvido em Minas Gerais entre o PT e o PSDB.

—O PSDB tem dois nomes fortes para a Presidência, em 2010. Vai apoiá-los?
—Acho que 2010 está muito longe. O que eu gostaria para 2010 é avançar de onde o PT não conseguiu: estabeler relações políticas maduras entre o Parlamento e o Executivo. Temos boa política econômica e boa política social, mas o processo político está deteriorado.

—Os candidatos do PSDB encarnam essa estratégia?
—Somos todos uma geração que lutou pela democratização e conseguiu grandes avanços. Tanto Aécio quanto Serra podem encarnar. A tese de pessoas que não conseguiram é de que isso não é possível, de que tem de comprar deputado, tem de ser fisiológico para governar.

—O senhor trata de grandes temas nacionais. Como convencer o eleitor de que também é preparado para questões locais?
—Desde 2004 eu tenho um site chamado Cidade Sustentável e presto assessoria para prefeitos e vereadores. A idéia é procurar experiências que deram certo nas cidades do mundo, estudando e adaptando cada situação. Então há muito tempo eu reflito sobre soluções urbanas.

—Quais são os pontos positivos e negativos da gestão do grupo de Cesar Maia?
—Houve momentos positivos. Ele prometeu e reconstruiu o Circo Voador, sempre foi muito solícito. Mas parece que abandonou um pouco a cidade e reagiu mal à reclamação da população, pareceu um desrespeito.

—Serão quatro candidatos ligados à esquerda. Disputam o mesmo eleitorado?
—Não se pode entender o século XXI com as categorias do século passado. Essa oposição entre esquerda e direita não corresponde mais à verdade. Não vejo dificuldades de me relacionar com a chamada direita para resolver problemas. Muitas soluções não dependem de ser de esquerda ou de direita. Saúde, por exemplo.

—Seu eleitorado é mais concentrado em áreas elitizadas. O senhor conseguirá entrar em áreas populares?
—Perfeitamente. As pessoas hoje têm um conhecimento maior da política. Não existe mais isso de estar condenado a ter votos só na Zona Sul ou só na Zona Norte.—Sua defesa de temas polêmicos, como a legalização da maconha, pode interferir na campanha?—Evidentemente meus adversários vão usar isso. Mas eu não posso me preocupar muito com o que meus adversários vão fazer, porque eu tenho muito o que fazer para o Rio. A situação da cidade é grave, a população não quer que os candidatos fiquem perdendo tempo condenando uns aos outros. Existe uma necessidade de mudança. As pessoas sentem que é preciso mudar.

8.3.08

A missão de Gabeira

ISTOÉ, edição 2001, 12/03/2008:

A missão de Gabeira
Candidatura do deputado à Prefeitura do Rio qualifica o debate e pode resgatar o PV

FRANCISCO ALVES FILHO

Ao tomar a palavra, na reunião realizada na manhã da segunda- feira 3 entre políticos cariocas do PV, PPS e PSDB, o deputado federal Fernando Gabeira disse exatamente o que os 40 presentes queriam ouvir: “Coloco meu nome à disposição para disputar a Prefeitura do Rio.” Surgia naquele momento, em plena sede tucana, no centro da cidade, a principal novidade da corrida à sucessão de Cesar Maia. “Fiquei muito tempo ligado nas questões nacionais e internacionais. Agora, quero dar minha cota de esforço pela recuperação da cidade”, justificou-se o deputado, que, por tabela, também eleva, com sua sólida candidatura, um pouco o prestígio que o Partido Verde vem perdendo entre eleitores e militantes. A tríplice aliança deverá ser confirmada nos próximos dias. A entrada de Gabeira em cena sacode uma campanha que é marcada pela mesmice desde que o atual prefeito construiu sua hegemonia eleitoral, há 15 anos. “Ele vai elevar a qualidade do debate”, avalia o cientista político Geraldo Tadeu, diretor-presidente do Instituto Brasileiro de Pesquisa Social (IBPS). Para o prefeito, a entrada do deputado do PV na disputa também poderá dar um tom de “esquerdização” na imagem do PSDB com vistas às eleições presidenciais de 2010. Isso favoreceria uma possível candidatura de José Serra. “Não poderia ter sido mais adequado para aquele grupo do PSDB de São Paulo”, escreveu Cesar Maia em seu blog.

Antes de se decidir pela candidatura, Gabeira tinha sérias dúvidas. Não sabia se era possível fazer uma campanha sem esbarrar em expedientes viciados, como os identificados no caso do Mensalão. Só aceitou concorrer depois de apresentar uma lista de exigências, entre as quais mostrar suas contas de campanha na internet e não aceitar indicações políticas para cargos no governo, caso vença a eleição. Quanto às chances de ganhar, o próprio Gabeira não arrisca palpite. “Ainda não avaliei desse ponto de vista”, diz. Na pesquisa realizada pelo IBPS, Gabeira aparece em sexto lugar, com meros 5,5% de intenção de voto. Por conta da defesa de temas polêmicos, como a união civil de homossexuais e a descriminalização da maconha, ele tem a terceira maior rejeição no levantamento do instituto. “Nesse momento, o deputado não parece ter boas chances”, avalia Geraldo Tadeu. A corrida, no entanto, está apenas começando, já que 90,5% dos pesquisados ainda não fizeram sua escolha. Desde já, o aparecimento de um candidato que não teme ser sincero com o eleitor e para quem o fisiologismo deve ser banido da política é um fato a ser saudado pelos cariocas.

Os novos números
Pesquisa do IBPS para a Prefeitura do Rio

Marcelo Crivella (PRB) - 18,0%
Denise Frossard (PPS) - 14,0%
Jandira Feghali (PCdoB) - 11,9%
Eduardo Paes (PMDB) - 11,3%
Solange Amaral (DEM) - 7,4%
Fernando Gabeira (PV) - 5,5%

(realizada entre 20 e 22 de fevereiro)

6.3.08

Pró-células-tronco embrionárias

5.3.08

O Rio de Janeiro não é um burgo podre

Folha de S. Paulo e O Globo, 05/03/2008:

ELIO GASPARI

O Rio de Janeiro não é um burgo podre

As chances de Gabeira são pequenas, menores que as de Barack Obama em março do ano passado

A CANDIDATURA de Fernando Gabeira à Prefeitura do Rio de Janeiro será um sopro de inteligência na campanha eleitoral de uma cidade que parece entregue a um condomínio de caciques, comendadores e poderosos chefões. Na ponta do lápis, sua chances são pequenas, menores que as de Barack Obama em fevereiro do ano passado.

Desprezando o pedaço de sua biografia que ficou no século passado, vale relembrar que Gabeira mandou o PT passear em outubro de 2003. Naquela época, os poderosos da República veneravam a trindade de comissários do "núcleo duro" do governo: José Dirceu, Antonio Palocci e Luiz Gushiken. (O primeiro registro digno de fé da existência de um sistema de mesadas no Congresso é de fevereiro do ano seguinte. O termo mensalão só aparece em setembro.)

Aos 67 anos, o deputado do PV entra em mais uma briga, carregando nas costas a mochila da decência. Há candidatos em quem se vota para ganhar e há aqueles com quem se vai na certeza da derrota. Lula em 1994 e 1998 foi um exemplo desse paradoxo da democracia. Gabeira parece ter essa qualidade. É melhor perder com ele do que ganhar com alguns de seus concorrentes.

Em 1973, opondo-se à fusão dos Estados do Rio e da Guanabara, que continha a valorosa cidade de São Sebastião, o economista Eugênio Gudin escreveu um memorável artigo intitulado "A Guanabara não é um burgo podre". Quase meio século depois, grande parte do poder político da cidade concentrou-se nas mãos de oligarcas e chefões.

Gente estranha, que se elege coligando-se com o inimigo a quem chamou de ladrão ontem e chamará novamente amanhã. Politicamente, o Rio de Janeiro nunca esteve tão perto de virar um burgo podre.

Nunca é demais lembrar que foi Nosso Guia, associado ao comissário José Dirceu, quem permitiu o aparecimento da dinastia dos Garotinho e de seus derivados. Em 1998, a dupla interveio no PT do Rio de Janeiro e detonou a candidatura de Vladimir Palmeira ao governo do Estado. Só o tempo dirá se essa decisão pode ser comparada à chegada do mosquito da febre amarela ao porto da cidade.

A presença de Fernando Gabeira na eleição talvez não resulte na sua ida para a prefeitura, mas terá três efeitos, todos benéficos. No primeiro, melhorará o nível de decência da disputa. Mesmo que melhore pouco, isso já será alguma coisa. No segundo, justificará a ida de pessoas para a rua, nem que sejam cinco. A idéia de ver alguém numa esquina agitando uma bandeira sem aquela cara de quem está esperando um lanche e R$ 50 já faz bem à alma. No terceiro, o mais relevante, trará uma voz que nunca se associou à demofobia que tomou conta da agenda político-social do burgo. Afinal, a Rocinha não é "uma fábrica de produzir marginal". Se fosse, o Rio já teria acabado.

O carioca não vive numa cidade qualquer. Quando ele vem pela avenida Rio Branco, passa pelo monumento a Floriano Peixoto, dobra e cruza com Deodoro da Fonseca e Getúlio Vargas. Quando chega à Siqueira Campos, vê o bronze (horrendo) dos 18 do Forte. Foi na sua cidade que aconteceram as coisas que fizeram a história daquelas pessoas. Era numa esquina de Ipanema que Tom Jobim e Vinicius de Moraes viam o mundo inteiro se encher de graça.

4.3.08

Vote em Andreizinho!

ANDREI BASTOS

Estou pensando em me candidatar nas próximas eleições municipais. A partir do que observei no quadro político atual, tomei algumas providências e relacionei outras tantas para o período de campanha. A primeira e fundamental iniciativa, no sentido fundamentalista mesmo, foi incorporar o diminutivo ao meu nome. De agora em diante, quero ser conhecido como “Andreizinho”.

É verdade que nem todos os atuais parlamentares bem-sucedidos eleitoralmente e na mídia, tanto no noticiário político como no policial, usam o diminutivo. Mas, sem dúvida, esta é uma característica que impõe muito respeito e tem grande poder de influenciar os eleitores. Como estou começando tarde nesta carreira, resolvi adotar todas as receitas de sucesso para ver se tiro a diferença.

A segunda providência que tomei foi convocar alguns amigos para formarmos um grupo de apoio à nossa comunidade, sob a minha liderança inquestionável, é claro! Já que o que pode ser identificado como minha comunidade margeia o asfalto da Zona Sul carioca, transformarei o assistencialismo tradicional praticado por esse tipo de grupo em mamata, boquinha ou coisa parecida, mas, quanto às práticas de garantia da segurança patrimonial dos cidadãos, sejam comerciantes, empresários ou donas de casa, nada como os procedimentos tradicionais, embora otimizados por conceitos como “prendo e arrebento”, do general Figueiredo, e “quem for contra, leva bala”, do senador Paim.

Como sou “da paz”, minha intenção é “prender” os eleitores no meu coração, “arrebentá-los” de tanto amor e dedicação e “mandar bala”, de caramelo, é claro, para adoçar o sentimento de quem for contra mim. Mas isso não elimina a necessidade de blindar meu quarto de dormir, que foi uma idéia sensata de um parlamentar noticiada na coluna de Ancelmo Góis no jornal O Globo.

As outras atividades importantes a que nosso Grupo de Apoio Comunitário (GAC), podemos chamá-lo assim, se dedicará serão no campo da prestação de serviços de transporte coletivo alternativo, para ocupar o espaço deixado pelo Estado, e de TV a cabo, para estimular a concorrência, o que proporcionará não só empregos para membros da comunidade menos qualificados para atender ao cumprimento da “lei de Gérson” como acrescentará dividendos ao fundo criado para meu patrimônio pessoal, quer dizer, projeto político.

Estou absolutamente convencido de que, com essas providências, conseguirei me eleger, me locupletar e, de quebra, contribuir para que um dia a sociedade não venha a sentir saudade dos políticos ladrões.

É preciso estar atento e forte.

2.3.08

Lições de mau jornalismo

Fonte: Direto da Redação, 28/02/2008:

Lições de mau jornalismo

MAIR PENA NETO*

Com a manchete de capa “Já vai tarde” sobre uma foto de perfil contraluz de Fidel Castro, a revista Veja prestou mais um desserviço ao jornalismo brasileiro ao tratar com fúria reacionária o dirigente cubano que deixava o poder após quase meio século e abandonar qualquer tentativa de compreensão do significado do gesto para o futuro da ilha. Enquanto a mídia do mundo todo buscava decifrar o que será de Cuba pós-Fidel, Veja saía com um artigo editorializado, destinado a destruir a imagem do líder e seu significado na história, com juízos definitivos e texto folhetinesco, que se encaixariam bem no boletim dos cubanos exilados em Miami, mas não na maior revista em circulação no país.

É bem verdade que Veja já abriu mão de um jornalismo sério há algum tempo, mas uma edição como essa não deixa de ser reveladora. Não faz muito tempo, a semanal também se dedicou a tentar destruir o mito Che Guevara, destacando, entre outros aspectos menos nobres, que cheirava mal.

Nas duas edições, Veja nem tentou disfarçar suas matérias com alguma suposta imparcialidade jornalística. Os textos raivosos eram endossados por fontes declaradamente interessadas em condenar os líderes da revolução cubana. Na edição em que tentou desmitificar Che Guevara, Veja ouviu um agente da CIA enviado à Bolívia para caçar o guerrilheiro. Na matéria sobre Fidel, havia apenas um boxe com um dissidente que vive em Miami.

Por sinal, o dissidente Héctor Palacios Ruiz era a voz mais lúcida da edição ao reconhecer em Fidel a habilidade, a inteligência e classificá-lo de um ícone da história. Um contraste com o texto da revista que o chama de farsante, fingidor e sanguinário.

Em seu blog, o jornalista Luis Nassif tem se dedicado a descrever práticas do “jornalismo” da Veja, muito mais graves do que as tentativas de desconstrução de mitos e bem distantes, para dizer o mínimo, das normas de um jornalismo sério e de qualidade.

A prepotência de Veja me fez recordar um episódio no fim dos anos 80, quando cobria um Grande Prêmio do Brasil de Fórmula 1, ainda no autódromo de Jacarepaguá. O repórter da revista estava escalado para fazer uma entrevista com Alain Prost, tarefa ingrata, já que as corridas não são o melhor momento para uma entrevista de fôlego com qualquer piloto, ainda mais com uma das maiores estrelas do automobilismo à época.

Depois de esgotar todas as tentativas, o repórter apareceu desesperado no autódromo, comentando a última recomendação de seu editor para que ele conseguisse a difícil entrevista: “fala pra ele que é da Veja”, contou, indignado, para gargalhada geral dos coleguinhas.

Mas na postura da Veja há que se destacar um “mérito”. A revista revela-se, para quem ainda tinha dúvidas, um veículo de direita, sem limites para desenvolver suas pautas e descompromissada com os mais elementares princípios do jornalismo. Enfim, uma publicação para não ser levada a sério.

*Trabalhou no Globo, JB e Agência Estado. Foi correspondente da F-1 em Londres, durante três anos. Foi editor de política do JB e repórter especial de economia. Atualmente trabalha na agência Reuters.

É preciso salvar vidas

Revista Veja, edição 2050, 05/03/2008:

Entrevista: Mayana Zatz
É preciso salvar vidas

A pesquisadora explica por que é urgente que o STFlibere as pesquisas com células-tronco embrionárias

Vanessa Vieira

“Há quem confunda estudos com células-tronco embrionárias com aborto. Isso é um absurdo. Enquanto os embriões não têm células nervosas, nem estão num útero, não são seres vivos”

A bióloga Mayana Zatz é uma das maiores especialistas em células-tronco do país, com quase 300 trabalhos científicos publicados. Nascida em Israel, mora no Brasil desde os 7 anos. Atualmente, ela é pró-reitora de pesquisa e coordenadora do Centro de Estudos do Genoma Humano da Universidade de São Paulo. Mayana estuda há mais de trinta anos terapias para doenças neuromusculares, razão pela qual se tornou uma das maiores defensoras, no país, das pesquisas com células-tronco embrionárias, as únicas capazes de se converter em qualquer um dos 216 tipos de célula do corpo humano. Desde 2005, quando o Congresso aprovou a lei brasileira de biossegurança – que autoriza o uso em pesquisas de embriões congelados há mais de três anos –, Mayana luta para que a lei entre em vigor. Isso porque, naquele mesmo ano, a Procuradoria-Geral da República entrou com uma ação de inconstitucionalidade contra a lei. Desde então, os estudos com células-tronco embrionárias estão parados no Brasil. Na semana que vem, o Supremo Tribunal Federal dará sua palavra final sobre o uso dos embriões. Nesta entrevista a VEJA, Mayana defende que o Brasil precisa se juntar quanto antes aos países que pesquisam células-tronco embrionárias.

Veja – As pesquisas com células-tronco embrionárias encontram-se proibidas no Brasil sob o argumento de que vão contra dois princípios constitucionais: o de que a vida é inviolável e o que garante a dignidade da pessoa. Como a senhora avalia essa proibição?
Mayana – Essa proibição é absurda. Inviolável é a vida de inúmeros pacientes que morrem prematuramente ou estão confinados a uma cadeira de rodas e poderiam se beneficiar dessas pesquisas. É preciso entender que os cientistas brasileiros só querem fazer pesquisa com os embriões congelados que permanecem nas clínicas de fertilização, e sempre com o consentimento do casal que os gerou. Se o casal, por algum motivo religioso ou ético, for contra doar seus embriões, não precisará fazê-lo. Deve-se lembrar que o destino dos embriões que não forem utilizados para pesquisa é ficar congelados até ser descartados. Estamos falando de embriões que nunca estiveram num útero, nem nunca estarão. Não existe nenhuma possibilidade de vida para eles.

Veja – Afinal, quando começa a vida? Do ponto de vista da ciência, o embrião é um ser humano?
Mayana – Não existe um consenso sobre quando começa a vida. Cada pessoa, cada religião tem um entendimento diferente. Mas existe, sim, um consenso de que a vida termina quando cessa a atividade do sistema nervoso. Quando o cérebro pára, a pessoa é declarada morta. Pelo mesmo raciocínio, se não existe vida sem um cérebro funcionando, um embrião de até catorze dias, sem nenhum indício de células nervosas, não pode ser considerado um ser vivo. Pelo menos não da forma que entendemos a vida. Por isso, todos os países que permitem pesquisas com embriões determinam que eles devem ter no máximo catorze dias de desenvolvimento. Os embriões congelados que se quer usar no Brasil têm ainda menos tempo, entre três e cinco dias.

Veja – Quais são os principais oponentes da pesquisa com células-tronco embrionárias no Brasil?
Mayana – A oposição vem basicamente da Igreja Católica. Entre as igrejas evangélicas existe uma divisão, mas muitas são a favor. É fundamental que as pessoas entendam que não existe uma briga dos cientistas com a Igreja Católica. A decisão que o Supremo Tribunal Federal vai tomar na semana que vem, liberando ou não as pesquisas com células-tronco embrionárias, diz respeito a toda a sociedade. Por isso, é preciso que não haja desinformação. Há gente confundindo pesquisa com células-tronco embrionárias com aborto.

Veja – Como se manifesta essa confusão?
Mayana – Recebo e-mails surpreendentes de pessoas que perguntam: “Como a senhora tem coragem de interromper uma vida?”. Respondo: “Você sabe que esses embriões nunca foram implantados num útero? Você sabe que eles são resultantes de fertilização in vitro?”. O remetente, a seguir, pergunta: “Doutora, mas o que é fertilização in vitro?”. Já tive vários exemplos desse tipo de desinformação. Recentemente, um padre me mandou um e-mail observando que a grande maioria dos religiosos não teve a oportunidade de aprender ciências e biologia da mesma forma que a população em geral. Quando se aprovou a Lei de Biossegurança, em 2005, permitindo a pesquisa com células-tronco embrionárias, demos aulas para os senadores e deputados. Muitos deles, que primeiramente haviam votado contra as pesquisas, porque não entendiam do assunto, votaram depois a favor. Aí se vê a diferença que faz a informação. É bom lembrar que a Lei de Biossegurança foi aprovada com ampla maioria, depois de uma grande discussão no Congresso. Não foi na calada da noite. Ela obteve o aval de 96% dos senadores e 85% dos deputados.

Veja – Neste ano, a Campanha da Fraternidade da Igreja Católica tem como tema a defesa da vida e critica o uso de embriões em pesquisas. Num país com tantos católicos, que impacto essa campanha pode ter?
Mayana – O lema da campanha da Igreja é: “Escolhe, pois, a vida”. Achei fantástico, porque essa também é a escolha dos cientistas. Estamos preocupados com os pacientes que morrem por causa de doenças neurodegenerativas ou que estão imobilizados por causa de acidentes. Por isso é preciso que se entenda a diferença entre aborto e pesquisa com células-tronco embrionárias. No aborto, há uma vida dentro do útero de uma mulher. Se não houver intervenção humana, essa vida continuará. Já na reprodução assistida, é exatamente o contrário: não houve fertilização natural. Quem procura as clínicas de fertilização são os casais que não conseguem procriar pelo método convencional. Só há junção do espermatozóide com o óvulo por intervenção humana. E, novamente, não haverá vida se não houver uma intervenção humana para colocar o embrião no útero.

Veja – Qual é a contribuição brasileira às pesquisas com células-tronco embrionárias?
Mayana – Muito pequena. Temos uma contribuição significativa em clonagem reprodutiva animal e na pesquisa de terapias com células-tronco adultas na área cardíaca. Com células embrionárias, quase não temos resultados. Acho que nem sequer temos estudos publicados. As células-tronco adultas só formam alguns tecidos, como músculo, osso, gordura e cartilagem. Com elas, não se consegue formar células nervosas, fundamentais para tratar doenças neuromusculares, para regenerar a medula de alguém que ficou paraplégico ou tetraplégico ou para tratar um parente que tem Parkinson. Se não tivermos células-tronco embrionárias para formar neurônios, todas essas pesquisas ficarão prejudicadas.

Veja – Em que países as pesquisas com células-tronco embrionárias estão mais avançadas?
Mayana – Inglaterra, Austrália e Israel, onde a lei permite esse tipo de pesquisa há muito tempo. Nos países de Primeiro Mundo, em geral, onde há uma grande preocupação com a saúde da população, esse tipo de pesquisa é permitido. O ambiente mais favorável nesses países depende de uma série de fatores. Um deles é a boa formação dos legisladores. A alocação de recursos e a presença de cientistas de ponta também são fundamentais. No Brasil, temos alguns centros de excelência, há cientistas que dominam a técnica e são capazes de fazer o que se faz no Primeiro Mundo, mas não em número suficiente. Outra dificuldade que enfrentamos é a demora para viabilizar as pesquisas, em qualquer campo. No Brasil, por causa de entraves burocráticos, levamos até seis meses para importar materiais de pesquisa, enquanto no exterior o tempo é de 24 a 48 horas. Lá fora, entre ter uma idéia e executá-la perde-se um dia. Aqui, passam-se meses. Mas novas medidas prometem tornar as importações mais ágeis.

Veja – Quais podem ser as conseqüências do atraso brasileiro nas pesquisas com células-tronco embrionárias?
Mayana – Teremos de pagar royalties gigantescos para importar uma tecnologia que poderíamos estar produzindo aqui. Em segundo lugar, se amanhã houver no exterior tratamentos com células-tronco embrionárias não disponíveis no Brasil, as pessoas com boa situação financeira irão para fora se tratar. O que os pobres vão fazer? O SUS vai cobrir os custos de um tratamento no exterior? Eu atendo pacientes com doen-ças muito graves. Quando comunico aos pais de uma criança que o filho deles tem uma doença para a qual não existe cura, eles sempre me perguntam, angustiados, se em algum lugar do mundo existe possibilidade de tratamento. Se o casal tem dinheiro, eu até o incentivo a ir ao exterior, para que tenha a certeza de que tentou tudo. Se os pais não têm recursos, digo que todos os tratamentos disponíveis lá fora podem ser feitos aqui. Mas, se amanhã houver no exterior tratamentos com células-tronco embrionárias que não estão disponíveis aqui, os casais mais pobres vão entrar em desespero.

Veja – O presidente George W. Bush é um dos mais ferrenhos opositores às pesquisas com células-tronco embrionárias. Que impacto tem essa posição do governo americano no cenário científico internacional?
Mayana – Certamente a postura do presidente Bush tem um peso negativo. Nos Estados Unidos, os projetos nessa área não podem receber dinheiro público. Em compensação, as pesquisas científicas contam com enormes investimentos da iniciativa privada. Muitos trabalhos com células-tronco embrionárias saíram de lá. Só na Califórnia, em 2005, investiram-se 3 bilhões de dólares em pesquisas com células-tronco.

Veja – Como a senhora responde aos críticos que dizem que as pesquisas com células-tronco, mesmo as adultas, vão na contramão da natureza?
Mayana – Quando você faz uma cesariana, e não um parto, está indo contra a natureza. Quando vacina seus filhos, está aumentando a imunidade deles e indo contra a natureza. Quando alguém tem uma pneumonia e você dá um antibiótico, está indo contra a natureza. É porque temos ido tão freqüentemente contra a natureza que a expectativa de vida tem subido tanto no mundo. Vejo em grande parte as células-tronco como uma possibilidade de regenerar órgãos, como um substituto para os transplantes. Hoje, a sociedade aprova quando um indivíduo está doente e recebe um transplante de coração. Mas não é fácil fazer um transplante. Há filas para receber um órgão, há o desafio de achar um doador compatível. No futuro, se conseguirmos regenerar o coração, ou outros órgãos, com células-tronco, não haverá razão para não fazê-lo.

Veja – Os estudos sobre as células-tronco adultas evoluem rapidamente, mas suas aplicações práticas ainda são muito restritas. Falta muito para que a medicina se beneficie amplamente desses estudos?
Mayana – Hoje, as células-tronco adultas são usadas no tratamento de doenças do sangue, como leucemias, anemias e talassemia. Nas outras áreas, tudo o que há são tentativas terapêuticas. A grande barreira para desenvolver tratamentos é que ainda não temos total conhecimento sobre a diferenciação celular, ou seja, o processo pelo qual uma célula-tronco se transforma em outro tipo de célula. Já sabemos que temos uma multiplicidade de células-tronco com diferentes potenciais. Mas não temos ainda como controlar essas células. Um exemplo: eu injeto células-tronco para regenerar o músculo de alguém, mas essas células resolvem que vão virar osso. Se isso acontecer, não tenho mais como controlar o processo.

Veja – Quais serão, no futuro, os principais benefícios dos tratamentos com células-tronco?Mayana – A terapia com células-tronco pode ser considerada como o futuro da medicina regenerativa. Entre as áreas mais promissoras, está o tratamento para diabetes, doenças neuromusculares, como as distrofias musculares progressivas e a doença de Parkinson. Com as células-tronco, também se poderá promover a regeneração de tecidos lesionados por causas não hereditárias, como acidentes, ou pelo câncer. O tratamento do diabetes é muito promissor porque depende da regeneração específica de células que produzem insulina, o que é mais fácil do que regenerar por completo um órgão complexo. As células-tronco vão permitir que as pessoas vivam muito mais e de forma saudável. Uma pessoa que precise de um transplante de coração ou de fígado, se tiver a possibilidade de fazer uma terapia com células-tronco em vez de esperar anos numa fila por um órgão novo, terá uma qualidade de vida muito melhor.

Veja – Alguns dermatologistas já anunciam tratamentos estéticos com células-tronco. Eles funcionam?
Mayana – Como ainda não temos controle total sobre a diferenciação celular, não faz sentido injetar células-tronco para melhorar a pele. Ainda não estamos prontos para isso. Daqui a alguns anos, pode ser. O conselho que dou aos potenciais clientes desses tratamentos é: investigue quem é o médico que os está oferecendo. Pesquise na internet, procure levantar o currículo dele, o que ele publicou sobre esse assunto, a que entidade está ligado.

Veja – Cientistas dizem que, dentro de alguns anos, será possível manipular o DNA dos embriões de forma a interferir nas características dos bebês. Estamos caminhando nesse sentido?
Mayana – Atualmente, só o que podemos descobrir é se um embrião tem uma mutação que determina uma doença específica. Se uma família sabe que tem uma doença genética qualquer, pode optar por fazer fertilização in vitro para selecionar um embrião livre do gene que predispõe o portador àquela doença. Nesse caso, acho válido. Evita-se que a criança nasça com uma doença genética grave. Também já é possível selecionar o sexo do futuro bebê, embora isso seja considerado antiético na maioria dos países. Mas existe uma perspectiva de que, nos próximos dez anos, seja possível seqüenciar o genoma de uma pessoa por 1 000 dólares. Ela pode descobrir que tem uma montanha de mutações. A questão ética é o que se vai fazer com essas informações. Talvez sejam usadas para rejeitar um candidato a emprego ou influir no custo do plano de saúde. Há inúmeras mutações que carregamos e nunca vão se manifestar.

Veja – No futuro será possível também selecionar embriões para gerar crianças mais inteligentes ou com determinadas características físicas?
Mayana – No caso de algumas características, sim, mas acho um absurdo manipular um embrião para que a criança nasça com olhos azuis, por exemplo. Sou totalmente contra. Até porque os padrões de beleza são variáveis. Hoje uma pessoa considerada bonita é de um jeito, mas daqui a vinte anos o padrão será outro. Seria muito difícil controlar todos os fatores genéticos que interagem na inteligência. O ambiente tem um papel muito importante. Lembro-me daquela experiência nos Estados Unidos em que mulheres foram fertilizadas com espermatozóides de ganhadores do Prêmio Nobel. Anos depois, não havia nenhum gênio entre os descendentes dessas mulheres. Ou seja, os resultados são totalmente imprevisíveis. As células-tronco servem para curar e salvar, não para fazer experiências exóticas.